Teresópolis tem o título de Capital Nacional do Montanhismo não é à toa, mas destacar as formações rochosas do município e região não é o suficiente para justificar essa fama mundo afora. Para quem conhece um pouco da história desse esporte, sabe que a terra de Teresa é referência nesse quesito. A conquista do Dedo de Deus, por exemplo, em 08 de abril de 2012, é vista como um marco para a escalada brasileira. Mas, 71 anos antes do feito de José Teixeira e companheiros, outra empreitada marcou o início do montanhismo na Serra dos Órgãos: O desbravamento da Pedra do Sino. A trilha mais conhecida do PARNASO foi aberta em abril de 1841 a mando do botânico inglês George Gardner, interessado em explorar nossa flora. Hoje, o parque federal é referência em pesquisas e o caminho aberto com a intenção de explorar a floresta é o mais frequentado da cadeia.
No ponto mais alto da cadeia, a 2.255m de altitude. Bem próximo, e também bem alta, a Pedra do Papudo
A primeira grande proeza na história do montanhismo na Serra dos Órgãos completou 177 anos em 10 de abril. Depois de vencer a mata virgem, cabendo o trabalho pesado a cerca de 100 escravos do colonizador George March, Gardner chegou aos 2.255m de altitude, que, só depois, descobriram ser o ponto mais alto da cadeia de montanhas que encantava o mundo. Muitos anos à frente, outra época marcou o Sino. Quatro abrigos foram construídos ao longo dos 11,5 quilômetros e a trilha bem aberta, de acesso muito mais fácil do que nos dias de hoje. Além disso, houve um tempo que se chegava ao cume a cavalo.
No ponto mais alto da Serra dos Órgãos, de olho na grandiosa Baixada e Rio de Janeiro
Para chegar ao marco zero, que marca o ponto mais alto, se faz uma caminhada de aproximadamente quatro horas. Porém, o tempo de subida pode variar bastante, de acordo com o peso da mochila e preparo físico da pessoa. Para quem nunca esteve lá, a dica é subir à noite e descer durante o dia. Duas impressões totalmente diferentes do trajeto. Subir admirando as luzes da cidade… Descer contemplando, fauna, flora e beleza cênica única. Porém, principalmente à noite, a presença de alguém que conheça o caminho é indispensável. De extrema importância também é nunca pegar atalhos. O caminho que parece mais curto geralmente é mais íngreme, e, pior, passar por ele causa danos quase que irreparáveis a trilha.
Abrigo Quatro, localizado a poucos metros do cume. Opção para quem não quer carregar peso
O Cavalo Fantasma
Em outros tempos, bem antes do moderno chalé que recebe montanhistas e turistas no abrigo de número quatro da Pedra do Sino, não era a trilha longa ou muito menos o frio que afastava as pessoas do ponto mais alto da Serra dos Órgãos. A história de que um “cavalo fantasma” costumava aparecer naquela clareira arrepiava qualquer um que por acaso tivesse que acampar lá em cima. E o “causo” foi contado por muitos anos, assustando mateiros experientes e até guias de montanha, havendo alguns relatos dos “relinchos da madrugada”.
Quase chegando: Montanhista no Campo das Antas, de olho no Abrigo Quatro e na montanha
A lenda faz parte da história do Parque Nacional e foi publicada no livro “Serra dos Órgãos” (Editora Brasiliense), de autoria de Claudio Nagy. “Os mais antigos, incluindo os ex-guardas florestais e alguns mateiros conhecedores da região, se convidados a servirem como guias rumo à Pedra do Sino, lhe dirão que não têm interesse em seguir em direção a tal pedra. Talvez um ou outro aceite ir mediante uma condição: A de não permanecer à noite nos campos de altitude, mais precisamente na Clareira do Quatro. Dizem que ocasionalmente o sono noturno dos aventureiros é perturbado pela visita inesperada de um cavalo invisível, que galopando apressadamente dá a nítida impressão que irá passar por cima de tudo e de todos. Em seguida, lança um fortíssimo relinchar de arrepiar até os mais incrédulos, acompanhado do reinício da sua cavalgada, a qual se distancia lentamente”, diz trecho do texto.
Montanhista no cume da Pedra do Sino. À esquerda, a Pedra do Papudo. Ao fundo, Teresópolis e o PETP
“Certa vez, dirigindo-me ao Sino com mais três amigos e sem conhecer essa história, chegamos ao Abrigo Quatro por volta das duas horas da manhã, sob um intenso nevoeiro. Rapidamente montamos um abrigo provisório, só estendendo um plástico sob e sobre os sacos de dormir e fomos nos deitar. Porém, para nosso espanto, logo a seguir ouvimos um som seco ecoando rente ao chão e em nossa direção. Instintivamente levantamos com receio de sermos atropelados. A única coisa de concreto que pudemos constatar foi o som do trote de um animal seguido do seu forte relinchar. Naquele dia não havia nada e ninguém no local além de nós. A trilha de acesso ao Sino estava extremamente ruim, dificultando até mesmo a nossa chegada até lá. De volta à civilização, tamanha foi a minha surpresa ao comentar o que acontecera com alguns guardas, e estes, de sobressalto, revelaram um antigo conhecimento do fato. Seja como for, os encantos naturais da Serra dos Órgãos (incluindo a Pedra do Sino) valem a pena ser conhecidos, e um pernoite no Abrigo Quatro lhe dará a rara oportunidade de contemplar em noites limpas um céu maravilhosamente ornamentado por milhares de estrelas reluzentes. O ar puro e o forte cheiro de mato o fará sentir parte integrante dessa natureza. Tudo isso e ainda mais: Existe a chance de você poder ser visitado por esse afobado, mas inofensivo cavalo noturno”, completa Claudio.
Contemplar o pôr do sol nessa montanha é um dos combustíveis para querer voltar