Anderson Duarte
E foi mais uma para a conta de inúmeras decisões liminares na longa história de Mario Tricano com o Judiciário de nosso estado. Nesta terça-feira, 31, o Desembargador Sérgio Ricardo de Arruda Fernandes, concedeu medida liminar suspendendo provisoriamente os efeitos do Decreto Legislativo que revogou a licença de até 180 dias por “motivos particulares” para o político, que agora terá liberdade para cuidar dos seus “muitos negócios” como alegou recentemente. Assim, enquanto os problemas da cidade se acumulam e a situação financeira e administrativa começa a beirar o caos, o gestor abre mão novamente de atuar como Chefe do Executivo, ironicamente o mesmo cargo que o político luta nesta mesma Justiça para ser apto por pelo menos dois pleitos seguidos. Quer ou não quer ser prefeito, perguntam os teresopolitanos?
A decisão do Desembargador não acrescenta nenhum elemento jurídico ao brilhante julgamento do magistrado de primeira instância, Marcio Olmo, que além de lembrar da falta de preceitos legais na decisão da Câmara, contextualizou o impacto social que o afastamento trouxe para a cidade. Sua base argumentativa transfere a decisão para apreciação posterior. “A Câmara Municipal, apreciando o requerimento, deferiu o seu pleito administrativo, vindo a ser expedido o Decreto Legislativo 001/2017, concedendo licença ao requerente, pelo prazo de 180 dias, a contar de 28 de agosto de 2017. Presume-se que, nesse momento, a Câmara Legislativa, apreciando os critérios de legalidade e conveniência, considerou cabível o pleito de licença e a concedeu em favor do impetrante. Nesse momento, o impetrante teve o seu direito subjetivo reconhecido pelo Poder Legislativo, cuja competência administrativa exsurge do artigo 32 da L.O.M. Contudo, sobreveio a revogação do Decreto Legislativo 001/2017, com a publicação de novo decreto (D.L. n° 002/2017), revogando, sem qualquer fundamentação, a licença anteriormente concedida e estabelecendo, de acordo com a legislação em vigor, a vacância do cargo de Prefeito em caso de não ser o mesmo assumido”, diz parte da decisão.
O Desembargador ainda segue com alguns questionamentos: “Ainda em sede de cognição sumária, temos que a revogação do ato administrativo que gerou o direito subjetivo ao gozo de licença não pode ser imotivada. Nada mais importante do que a transparência do ato de natureza administrativa. Impõe-se saber: o decreto legislativo originário padecia de algum vício? O Prefeito então em exercício não teria direito a obter a licença para tratar de assuntos particulares? Inexiste existe direito no âmbito do direito objetivo municipal? E no plano da finalidade administrativa, por que o ato anterior foi revogado? Sobreveio alguma mudança fática relevante? Enfim, um quadro inicial que recomenda, acima de tudo, a manutenção do statu quo ante, isto é, a permanência do exercício da licença anteriormente deferida, mormente porque existe, de um lado, o receio de resultado grave (declaração de vacância do cargo), ou de outro, o esvaziamento da pretensão deduzida em Juízo com o imediato retorno ao exercício do mandato. Tudo a ensejar o deferimento da medida liminar si et in quatum, aguardando-se a manifestação da Exma. Autoridade impetrada, trazendo os seus argumentos, de modo a que se possa formar, em sede de antecipação da tutela mandamental, um melhor e mais completo juízo de valor acerca do direito subjetivo afirmado pela parte impetrante. Assim sendo, defiro a antecipação da tutela recursal para o fim de conceder a medida liminar, suspendendo-se provisoriamente os efeitos do Decreto Legislativo n° 002/2017 da Câmara Municipal de Teresópolis”, finaliza a decisão liminar.
Nesta semana, o Juiz Márcio Olmo Cardoso considerou o ato como Nulo à luz do Direito e indeferiu o pedido de liminar impetrado por Tricano, que queria permanecer de licença pois, segundo ele, “… são três prédios para serem reformados, meu hotel para colocar as coisas em dia, meu haras e minha fazenda para cuidar”, disse em entrevista o político. Mesmo “oficialmente” substituído pelo seu vice, Sandro Dias, Tricano ainda teria permanecido como o gestor em prática, algo que segundo os edis caracterizou o desvio de função da licença.
A “revogação” da licença fez com que os assessores jurídicos do empresário buscassem o Judiciário para permanecer cuidando de seus “assuntos” privados, mas o magistrado não entendeu que cabia tal apelação. Em parte de sua decisão Olmo explica os motivos da não concessão dos efeitos liminares pretendidos pelo gestor. “Para concessão do pedido liminar em hipótese de mandado de segurança, necessário se faz a presença das condições específicas da segurança, quais sejam: o direito líquido e certo e a ilegalidade ou abuso de poder do ato de Autoridade. Com efeito, não merece prosperar o pedido liminar, uma vez que não se encontram presentes os requisitos dispostos em lei, mormente o direito líquido e certo. Na presente hipótese, o Prefeito Municipal de Teresópolis (Impetrante) solicitou à Câmara Municipal de Teresópolis o afastamento temporário do cargo por 180 dias para tratar de assuntos particulares. Note que a solicitação do Impetrante não foi motivada, se deu de forma genérica, sem mencionar os assuntos particulares que o levaram a ter pedido o afastamento temporário do cargo. Por sua vez, o ato que concedeu a licença requerida pelo Impetrante denominada ´licença para tratar de interesse particular´ é uma das espécies de licença de caráter discricionário, a qual, segundo critérios de conveniência e oportunidade, pode ser concedida sem que o ato seja motivado. E conforme se depreende das provas trazidas aos autos, o ato administrativo emitido pelo ente legislativo concedeu de forma genérica a licença sem motivar o ato, não se podendo aplicar no presente caso a Teoria dos Motivos Determinantes, pois, não se pode confundir a espécie de licença requerida com sua motivação”, explica.
“Portanto, não havendo motivos determinantes para embasar a concessão da licença ao Impetrante, não há falar em violação à mencionada Teoria o fato de a Câmara Municipal ter revogado a licença sem motivar a sua decisão. Na verdade, em observância a preceitos legais, todos os Poderes têm competência para revogar os atos administrativos editados por eles mesmos. Assim, verificando que o ato que afastou o Prefeito Municipal tornou-se inoportuno e inconveniente a Câmara Municipal poderá revogá-la. Segundo entendimento do nosso Egrégio Tribunal de Justiça, é discricionária a concessão da licença para tratamento de assuntos de interesse particular, estando, portanto, sujeita à revogação por ato também discricionário. Além do mais, a licença prevista na Lei Orgânica do Município de Teresópolis deve ser interpretada sempre à luz das Constituições Federal e Estadual. E não havendo previsão de licença do Prefeito para tratamento de assuntos de interesses particulares na Lei Orgânica Municipal, nem nas Constituições Estadual e Federal, o ato que a concedeu deve ser tido como nulo, por estar desprovido de amparo legal que o valide no mundo jurídico. Desta forma, não podendo o Judiciário aferir o mérito do ato administrativo discricionário e sendo a licença concedida ao Impetrante inconstitucional, não há elementos suficientes nos autos a autorizar a concessão da medida liminar pretendida. Posto isso, INDEFIRO, por ora, o pedido liminar”, finaliza o Juiz.