Wanderley Peres
O prefeito Vinícius Claussen publicou em suas redes sociais decisão liminar que conseguiu no juízo da Comarca e que garantiria a sua elegibilidade. “A Justiça confirmou, nesta quinta-feira, 15, o que já tínhamos falado antes. Essa fake news da perda dos direitos eleitorais é mais uma tentativa de desgastar o nosso trabalho e tirar o foco dos resultados que todos estão vendo nas ruas”, disse.
Ao suspender os efeitos do parágrafo único do artigo 1o do Decreto Legislativo do Município de Teresópolis no 001/2022, publicado no Diário Oficial Eletrônico do Poder Legislativo de 14/12/2022 (artigo 7o III da Lei 12.016/2009), decisão que foi atacada pelo prefeito, o juiz Carlo Arthur Basílico apontou para a questão da competência da Câmara de Vereadores, outorgada pelo artigo 31 da Constituição Federal, pelo artigo 124 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e pelo artigo 49 da Lei Orgânica do Município de Teresópolis, verificando que ela se limita ao poder de aprovar ou desaprovar as contas. “Não cabe à Casa Legislativa deliberar acerca de requisitos outros que seriam necessários para caracterizar eventual fundamento de declaração de inelegibilidade pelo órgão competente. À Câmara de Vereadores compete somente deliberar sobre as contas, constituindo essa deliberação somente um dos requisitos objetivos previstos em lei – a desaprovação das contas do gestor do orçamento no período – como integrantes de um quadro complexo de análise formativa de uma declaração de inelegibilidade à luz de outros requisitos, dentre eles o de insanabilidade da irregularidade”, observando, inclusive, a própria resistência do Vereador Presidente da Casa Legislativa, que foi contrário à aprovação dessa declaração, lançada no parágrafo único do artigo 1º do Decreto Legislativo em berlinda, mas acompanhou posteriormente a maioria após a ponderação dos demais Edis sobre não ser possível, do ponto de vista regimental, a aprovação somente parcial do texto do ato legislativo projetado”.
Decisão liminar, e que deverá ser mantida ou não discutida depois da promoção do mérito pelo Ministério Público, porque restou como óbvio o erro da Câmara, a vitória do prefeito é irrelevante, e inóqua até, porque não garante elegibilidade alguma, apenas o fato de sua inelegibilidade não poder ser afirmada ou não em decreto legislativo, embora ela seja iminente pelo curso natural da decisão do Tribunal de Contas ao ver-se confirmada pela Câmara de Vereadores, porque, embora não trate de “roubo ou rombo”, as contas mal feitas do prefeito caracterizam lesão ao erário, por ação e omissão, e são resultados de uma série de atos que, segundo a lei, são considerados atos dolosos de improbidade administrativa, como previstos no incisos 9 a 11 da Lei 8429, daí o fato, iminente, da inserção do nome do prefeito de Teresópolis no rol dos inelegíveis, porque consta conta de exercício sob a sua responsabilidade como reprovadas, por atos considerados de improbidade, vide box, onde os incisos 9 e 11 tratam justamente dos erros das contas do exercício 2020, sob a responsabilidade de Vinícius Claussen.
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:
IX – ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;
XI – liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;
Lei 8429
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro
Comarca de Teresópolis
1a Vara Cível da Comarca de Teresópolis
Processo: 0807483-88.2022.8.19.0061
Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120)
AUTOR: VINICIUS CARDOSO CLAUSSEN DA SILVA
AUTORIDADE: CAMARA MUNICIPAL DE TERESOPOLIS
DECISÃO
Trata-se de Mandado de Segurança Preventivo interposto pelo Excelentíssimo Senhor Prefeito do Município de Teresópolis, VINÍCIUS CARDOSO CLAUSSEN DA SILVA, contra ato do Excelentíssimo Senhor PRESIDENTE DA CÂMARA DE VEREADORES DE TERESÓPOLIS, JOSÉ LEONARDO VASCONCELLOS DE ANDRADE, que decretou a inelegibilidade do impetrante na Sessão Ordinária da Casa Legislativa Municipal no dia 13/12/2022. Por ocasião da impetração, o decreto legislativo respectivo, apesar de aprovado o seu teor em plenário, por maioria de votos, não havia sido ainda publicado no Diário Oficial, razão pela qual foi pedida liminar em caráter preventivo para sustar os efeitos da deliberação, e também formulado pedido sucessivo para a hipótese de sua apreciação se dar posteriormente àquela publicação. É este o caso. Em petição protocolada hoje (14/12/2022) o impetrante junta o teor do Decreto Legislativo no 001 de 13/12/2022, publicado no Diário Oficial Eletrônico da Câmara Municipal de Teresópolis, com o seguinte teor:
“DECRETO LEGISLATIVO N° 001 DE 13 DE DEZEMBRO DE 2022.
EMENTA – DISPÕE SOBRE A REPROVAÇÃO DAS CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL
DE TERESÓPOLIS, RELATIVAS AO EXERCÍCIO FINANCEIRO DO ANO 2020.
O PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE TERESÓPOLIS, no uso da atribuição que lhe confere a Lei Orgânica Municipal e o Regimento Interno, faz saber que a Câmara Municipal aprovou e ela promulga o seguinte Decreto Legislativo:
ART. 1° São Reprovadas, em sua totalidade, as contas da Prefeitura Municipal de Teresópolis, relativa[s] ao exercício financeiro do ano de 2020, em conformidade com o Parecer Prévio do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, processo administrativo no 716/2021.
Parágrafo Único: aplica[m]-se os termos estabelecidos no art. 1o, alínea “g” da Lei Complementar no 64/90, em face das irregularidades insanáveis praticadas no exercício financeiro de 2020, em conformidade com o parecer do TCERJ.
ART. 2o Este Decreto Legislativo entra em vigor, na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
CÂMARA MUNICIPAL DE TERESÓPOLIS
EM 13 DE DEZEMBRO DE 2022.”
O impetrante alega que o disposto no parágrafo único do artigo 1o do Decreto Legislativo Municipal 001/2022 é inválido, porque lhe impõe sanção de inelegibilidade em manifesto desacordo com o que dispõe a Lei Complementar 64/1990. Transcreve o disposto no artigo 1o I, “g” e parágrafo 4o-A da Lei Complementar 64/1990, destacando que a sanção de inelegibilidade para qualquer cargo àqueles que tiverem suas contas rejeitadas exige que a conduta configure ato doloso de improbidade administrativa reconhecido por decisão irrecorrível do órgão competente (inciso I alínea “g”), aduzindo que essa sanção não se aplica aos responsáveis que tenham tido suas contas julgadas irregulares sem imputação de débito e sancionados exclusivamente com o pagamento de multa (parágrafo 4-Ao).
Observa que a caracterização do dolo na conduta pressupõe o trânsito em julgado de declaração nesse sentido, proferida em julgamento de ação de improbidade administrativa, não sendo esse o caso, uma vez que sequer existe ação de improbidade em curso. Conclui afirmando que a simples desaprovação das contas não enseja – de acordo com o regime legal de improbidade – qualquer sanção de inelegibilidade.
Pede a suspensão liminar dos efeitos do parágrafo único do Decreto Legislativo 001/2022 até o julgamento definitivo desta ação mandamental.
É O BREVE RELATÓRIO.
Inicialmente, impõe-se observar que o regime das inelegibilidades – que suprime parcialmente o direito político de ser votado ou assumir cargo público do cidadão – tem assento na Constituição Federal e em Lei Complementar, segundo o disposto no artigo 14 §9o da Constituição. Tratando-se de norma sancionadora, sua interpretação deve ser estrita. A Lei Complementar 64/1990 estabelece os casos de inelegibilidade, regulamentando o disposto no artigo 14 §9o da Constituição Federal. Em princípio, para exame da liminar, não é necessário adentrar esse mérito. Há uma questão prejudicial que legitima a sua concessão, e diz respeito à competência do Poder Legislativo, que adiante se aprecia.
Competência do Poder Legislativo.
O artigo 31 da Constituição Federal estabelece que a fiscalização do Município, mediante o controle externo, será exercida pelo Poder Legislativo, com auxílio do Tribunal de Contas. Cabe à Câmara Municipal de Vereadores aprovar ou rejeitar as contas do Poder Executivo Municipal. O papel do Tribunal de Contas é, na verdade, maior do que o simples auxílio, uma vez que somente por decisão de dois terços da Câmara o parecer negativo do Tribunal de Contas pode ser afastado. No presente caso, a maioria dos senhores Vereadores votou pela rejeição das contas, seguindo o parecer do Tribunal de Contas.
Contudo, não se limitou a declarar a rejeição das contas. Foi além, para declarar insanáveis as irregularidades praticadas no exercício financeiro de 2020, para os fins estabelecidos no artigo 1o, “g” da Lei Complementar 64/1990, ou seja, deliberou sobre um dos requisitos indispensáveis para caracterização de inelegibilidade do gestor do orçamento, no caso, o impetrante.
Observo que o vídeo dos debates revela que o próprio Vereador Presidente da Casa Legislativa foi contrário à aprovação dessa declaração, lançada no parágrafo único do artigo 1o do Decreto Legislativo em berlinda, mas acompanhou posteriormente a maioria após a ponderação dos demais Edis sobre não ser possível, do ponto de vista regimental, a aprovação somente parcial do texto do ato legislativo projetado.
Pois bem, retomando a questão da competência da Câmara de Vereadores, outorgada pelo artigo 31 Constituição Federal, pelo artigo 124 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e pelo artigo 49 da Lei Orgânica do Município de Teresópolis, verifica-se que ela se limita ao poder de aprovar ou desaprovar as contas. Não cabe à Casa Legislativa deliberar acerca de requisitos outros que seriam necessários para caracterizar eventual fundamento de declaração de inelegibilidade pelo órgão competente. À Câmara de Vereadores compete somente deliberar sobre as contas, constituindo essa deliberação somente um dos requisitos objetivos previstos em lei – a desaprovação das contas do gestor do orçamento no período – como integrantes de um quadro complexo de análise formativa de uma declaração de inelegibilidade à luz de outros requisitos, dentre eles o de insanabilidade da irregularidade.
A competência o reconhecimento de insanabilidade, assim como a eventual declaração do dolo e caracterização de improbidade é do Poder Judiciário, dê-se ela no âmbito criminal, civil ou eleitoral, valendo observar que em princípio, por se tratar de elemento impediente do exercício de direitos políticos, cabe à Justiça Eleitoral a sua análise, sujeita, eventualmente, aos efeitos de coisa julgada proclamada nas demais esferas comuns, se for o caso. Nesse sentido, colhe-se a lição de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral – 18. ed. – Barueri –SP: Atlas, 2022, Biblioteca Virtual):
“Note-se, porém, que dentro de sua esfera competencial, tem a Justiça Eleitoral plena autonomia para valorar os fatos ensejadores da rejeição das contas e fixar, no caso concreto, o sentido da cláusula aberta “irregularidade insanável”, bem como apontar se ela caracteriza ato doloso de improbidade administrativa. É que a configuração da inelegibilidade requer não só a rejeição das contas, como também a insanabilidade das irregularidades detectadas e sua caracterização como improbidade. Se a rejeição (ou desaprovação) das contas é dado objetivo e facilmente verificável (basta uma certidão expedida pelo Tribunal de Contas ou pelo órgão Legislativo), a insanabilidade e a configuração da improbidade requerem a formulação de juízo de valor por parte da Justiça Eleitoral, única competente para afirmar se há ou não inelegibilidade.”
Assim, afigura-se, em princípio, inválido o parágrafo único do artigo 1o do Decreto Legislativo Municipal 001/2022, porque a declaração de situação jurídica promanada de autoridade incompetente é sancionada com nulidade pelo ordenamento jurídico, razão pela qual não produz qualquer efeito jurídico. A liminar deve ser deferida para que sejam suspensos todos e quaisquer efeitos da norma de efeitos concretos ora impugnada por meio desta ação mandamental.
POSTO ISSO:
- DEFIRO A LIMINAR para suspender os efeitos do parágrafo único do artigo 1o do Decreto Legislativo do Município de Teresópolis no 001/2022, publicado no Diário Oficial Eletrônico do Poder Legislativo de 14/12/2022 (artigo 7o III da Lei 12.016/2009).
- Notifique-se o Excelentíssimo Senhor PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE TERESÓPOLIS, para ciência da decisão e para que preste informações no prazo legal (artigo 7o I da Lei 12.016/2009). Retifique-se na DRA para que conste corretamente o nome da autoridade coatora.
- Cientifique-se o Senhor Procurador-Geral da CÂMARA MUNICIPAL DE TERESÓPOLIS na forma do artigo 7o I da Lei 12.016/2009. Anote-se o nome da pessoa jurídica interessada na DRA.
- Prestadas as informações e se manifestando a pessoa jurídica interessada, ou decorrido o respectivo prazo, intime-se o nobre MINISTÉRIO PÚBLICO para promoção de mérito.
TERESÓPOLIS, 15 de dezembro de 2022.
CARLO ARTUR BASILICO
Juiz Titular