Wanderley Peres
Vinte e seis anos depois, o lixão do Fischer, finalmente, foi fechado pela Justiça. Publicada nesta quarta-feira, 28, a decisão da Desembargadora Inês da Trindade Chaves de Melo, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, tem data do dia anterior, 27, dia seguinte à tragédia ambiental do Fischer, ocorrida na manhã desta segunda-feira, 26, quando Teresópolis começou a semana debaixo de um espesso nevoeiro de fumaça tóxica. O mau cheiro da administração municipal levou diversas pessoas aos hospitais e tirou o sossego de toda a cidade, com órgãos públicos e comércios fechados, sacrificando ainda as crianças, que tiveram as suas escolas sem aulas até esta quarta-feira, 28. Três dias depois do início do sufoco, quando o rescaldo do fogo parecia estar sendo apagado, com a utilização de grande aparato de máquinas e homens, o prefeito diz em laives que ainda procura o suposto autor do crime, como também disse que procuraria nas últimas duas vezes em que o lixão pegou fogo, nos anos de 2021 e 2022, e só não vem encontrando o culpado por que não deve ter espelho em casa.
Depois de apresentar um arrazoado onde conta, passo a passo, como se deu o moroso processo na justiça que viabilizou o crime ambiental em curso, VEJA A DECISÃO, o juízo de segunda instância concluiu que “tudo isso restou corroborado pelo incêndio ocorrido ontem, 26/06/23, no lixão, cuja fumaça tóxica paralisou a cidade, interrompendo as aulas e o trânsito, … a demonstrar a necessidade de interdição do aterro”. A decisão ressalta ainda o descaso do Município [dos ex-prefeitos e do atual prefeito, Vinícius Claussen] em todos esses anos para com a situação do lixão e a destinação final dos resíduos locais. “Observo que, na verdade, embora pretenda a suspensão do ato do INEA, em nenhum momento aponta o Município qualquer irregularidade ou ilegalidade no processo administrativo no bojo do qual ele foi expedido”, deixando claro a justiça o vigor do auto que apontou para o crime ambiental ignorado pelas autoridades por tanto tempo e que, agora, pode ser cobrada a conta ao atual prefeito.
“Por mais complexa que possa ser a resolução do problema, os 26 anos de tramitação da ação civil pública se mostram tempo mais do que suficiente para que o Poder Executivo municipal promovesse uma solução definitiva. Contudo, novamente e após duas décadas, a Administração Pública municipal busca postergar a resolução do problema ambiental, já que desde a publicação – há quase 4 anos – da decisão liminar ora revogada não consta dos autos da ação civil pública n.º 0000320-38.1995.8.19.0061 quaisquer perspectivas concretas de uma política púbica eficaz e definitiva para a solução da questão”, afirmou o Ministério Público ao pedir o cancelamento da liminar, enfim alcançado, observando que a concessão de “nova flexibilização ao Município de Teresópolis, sem que ele apresente qualquer proposta concreta para a resolução do problema, é o mesmo que chancelar a omissão municipal diante do grave problema ambiental e de saúde pública”.
Liminar concedida pelo juízo da Comarca em 2018, no dia 6 de março, foi derrubada no Tribunal de Justiça, “por violar o princípio do devido processo legal, já que o INEA não faz parte da relação processual constituída nos autos da ação civil pública e sequer foi ouvido”. Mas, uma nova liminar foi concedida e o vazadouro clandestino de lixo, lixão, ou aterro descontrolado continuou.
“Em 15 dias vamos apresentar um pré-projeto, quando a sociedade poderá dar a sua contribuição, e em 30 dias, teremos um plano de ação. Nossa ideia é que, com esse plano emergencial, consigamos uma sobrevida para o aterro, talvez de três anos, tempo para elaborarmos um projeto efetivo. Uma das propostas é, talvez, montar uma usina de compostagem, uma vez que 56% do lixo recolhido são orgânicos e estamos numa região em que são produzidas 90% das folhosas no estado do Rio de Janeiro. Temos também que monitorar os grandes geradores de resíduos, como construção civil e supermercados”.
Localizado no km 75 da Estrada Rio-Bahia, no Fischer, o Aterro Sanitário de Teresópolis foi implantado em 2008 e funcionou de 2009 até aproximadamente 2015, quando gradativamente foi deixando de receber o tratamento adequado, voltando à condição de lixão. Com vida útil expirada em 2016, e descontrolado, o extinto Aterro recebe diariamente 180 toneladas de lixo.
PMT FALA SOBRE O EMBARGO DO ATERRO DO FISCHER:
Já foi peticionado junto ao judiciário, um acordo entre o município e o Instituto Estadual do Ambiente (INEA). Estamos aguardando uma decisão da justiça quanto à operação do aterro.
A DECISÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
AGRAVANTE: INSTITUTO ESTADUAL DO AMBIENTE – INEA
AGRAVADA: MUNICÍPIO DE TERESÓPOLIS
Cuida-se de Agravo de Instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE TERESÓPOLIS em face do INSTITUTO ESTADUAL DO AMBIENTE – INEA, contra decisão do Juízo da 1ª Vara Cível de Teresópolis, proferida em Tutela Provisória de Urgência Antecipada de Caráter Antecedente, que concedeu liminar para suspender a eficácia do Auto de constatação COFISCON/6.414, pelo qual o INEA sustou a operação do Aterro Sanitário do Município.
Na inicial narra o Município que junto a mesma 1ª Vara Cível daquela Comarca corre execução de Termo de Ajustamento de Conduta, originário da Ação Civil Pública nº 0000320-38.1995.8.19.0061, no qual restaram fixadas obrigações do Município de Teresópolis, para o fim de se estabelecer a adequação física e social na área do aterro sanitário e sua remedição ambiental, estabelecendo, ainda, a elaboração de um projeto conceitual, seguido de um projeto executivo para a implementação de uma nova unidade de Tratamento e Reaproveitamento de Resíduos Sólidos, firmado somente em 01 de agosto de 2003.
Aduz que, não obstante, foi intimado do “Auto de Constatação COFSCON/6414” emitido pelo Réu de “suspensão parcial ou total das atividades” do ente público na operação do aterro sanitário.
Assim, ante a inexistência no Município de Teresópolis outro local para operar o aterro sanitário, o que provocaria um dano ambiental de maiores proporções, diante do risco gravíssimo ao direito à saúde pública e direito ao meio ambiente, requereu a suspensão do “Auto de Constatação COFSCON/6414”.
Às fls. 107/108 daqueles autos o Ministério Público opinou pelo indeferimento da tutela.
De outro lado, sobreveio a decisão agravada, in verbis: …nem a interdição do funcionamento do aterro sanitário, nem a liberação de seu funcionamento sem um efetivo cumprimento das obrigações
impostas no TAC celebrado na fase de cumprimento do julgado da ação civil pública representam a adequada solução para o estado de coisas que se instaurou.
A interdição do aterro sanitário gerará o problema da inexistência de local para destino dos resíduos sólidos. A continuação da operação sem o cumprimento das obrigações e sem o planejamento da transição entre locais e sistemas agravaria o risco de degradação ambiental. Se as balizas estão contempladas em decisão judicial, cabe ao Poder Judiciário, especialmente ao Juízo da execução (cumprimento da sentença) deliberar a forma como a decisão será cumprida, e deliberar sobre as questões que sejam suscitadas por meio de ações conexas que possam influir na solução da questão.
(…)
A primeira medida que deve ser tomada é a suspensão dos efeitos da interdição administrativa determinada pelo Auto de Constatação COFSCON/6414 – Processo Administrativo E-07/002.6483/2014. Trata-se de sanção aplicada pelo réu, INEA, cujos efeitos imediatos seriam a completa desestruturação do sistema de coleta e armazenamento dos resíduos sólidos do MUNICÍPIO DE TERESÓPOLIS. (…) Por tudo isso impõe-se: (a) a suspensão dos efeitos da interdição administrativa determinada pelo Auto de Constatação COFSCON/6414 – Processo Administrativo E-07/002.6483/2014; (b) a designação de audiência especial de conciliação nos autos da Ação Civil Pública (Proc. 0000320-38.1995.8.19.0061) e também neste processo, de modo que possam estar presentes todos os atores e interessados, especialmente o MINISTÉRIO PÚBLICO, o MUNICÍPIO DE TERESÓPOLIS e o INEA. (…)
POSTO ISSO:
- Defiro a TUTELA DE URGÊNCIA para suspender os efeitos da interdição administrativa do aterro sanitário do MUNICÍPIO DE TERESÓPOLIS determinada pelo Auto de Constatação COFSCON/6414 – Processo Administrativo E-07/002.6483/2014.
Em suas razões aduz o INEA, em breves linhas a inexistência de qualquer vício apontado pelo Agravado no processo administrativo E07/002.6483/2014), no bojo do qual foi expedido o Auto de Constatação
COFISCON/6414.
Sustenta que a situação do Município perdura por mais de 15 anos, sem que tenha conseguido a Administração sanar o problema, de forma que Município não vem cumprindo sequer o TAC firmado na ACP anterior, não tendo se desincumbido de sua obrigação e não podendo alegar vício no ato praticado pelo Agravante, recorreu o Agravado por pleitear a suspensão de um ato administrativo regular e vinculado, revelando assim a total ausência de fundamentação jurídica para sua pretensão.
Assim, requer a concessão de efeito suspensivo da decisão agravada.
Pois bem.
Para concessão do referido efeito devem ser observados os requisitos legais, previstos nos art. 300 c/c 932, II do Código de Processo Civil de 2015.
No caso concreto, em sede de cognição sumaríssima, entendo que presentes os pressupostos legais para concessão da medida suspensiva recursal, já que não traz o Município elementos concretos que evidenciem a verossimilhança de suas alegações.
Noto que o processo administrativo no INEA(E07/002.6483/2014), teve início em 2014, que culminou com o Auto de constatação, em razão de diversas irregularidades no serviço público de coleta e destinação final de resíduos.
Como bem alerta o Agravante e o Ministério Público em primeira instância, as irregularidades decorrentes da destinação final de resíduos sólidos no território do Município de Teresópolis, é um problema que existente desde antes de 1995, ano em que foi proposta a ação civil pública 0000320-38.1995.8.19.0061, cujo TAC foi firmado em 2003 e que, como consta da própria decisão agravada, não vem sendo cumprido à contento.
Em 2018 no bojo da ação civil pública 0000320-38.1995.8.19.0061 o juízo da 1ª Vara cível de Teresópolis já havia deferido decisão para suspensão do ato administrativo do INEA, permitindo provisoriamente manutenção da operação no atual lixão municipal, o que restou afastado por decisão da 13ª Câmara Cível, no Agravo de Instrumento 0023895-53.2021.8.19.0000, já que o INEA não fazia parte daquele processo.
Consta ainda que o antigo lixão foi transformado em aterro controlado com recursos do Governo do Estado do Rio de Janeiro, o que na verdade parece ter agravado a situação, já que tanto o parquet quanto o Agravante narram ter ocorrido a transformação em um verdadeiro lixão à céu aberto.
Tudo isso restou corroborado pelo incêndio ocorrido ontem, 26/06/23, no lixão, cuja fumaça toxica paralisou a cidade, interrompendo as aulas e o trânsito, … a demonstrar a necessidade de interdição do aterro.
Assim, ressalta o descaso do Município em todos esses anos para como a situação do lixão e a destinação final dos resíduos locais. Observo que, na verdade, embora pretenda a suspensão do ato do INEA, em nenhum momento aponta o Município qualquer irregularidade ou ilegalidade no processo administrativo (E07/002.6483/2014), no bojo do qual foi expedido o Auto de Constatação COFISCON/6414.
Desta forma, defiro a efeito suspensivo pleiteado.
Informe ao Juízo de primeiro grau.
Ao Agravado para contrarrazões.
Após, dê-se vista à D. Procuradoria de Justiça.
Rio de Janeiro, 27 de junho de 2023.
Des. Inês da Trindade Chaves de Melo