Isla Gomes
O Estado Brasileiro é laico, ou seja, não tem religião. A liberdade religiosa é um dos direitos fundamentais da humanidade, como afirma a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Todavia, muitas vezes o preconceito existe e se manifesta pela humilhação imposta àquele que é diferente. Neste âmbito, surge um projeto inédito no país na área de segurança pública, o programa de proteção à liberdade de religião “Patrulha da Diversidade Religiosa” da PMERJ, que completa dois anos neste mês de fevereiro. A ideia inicial surgiu no município de Teresópolis em forma de reação da pedagoga e capelã Lilian Duarte, que relatou ter, por várias vezes, sofrido violência e preconceito religioso, inclusive tendo seu local de culto vandalizado. Lilian apresentou o projeto da iniciativa às autoridades e assim teve início este movimento que está em plena expansão, chegando a todo estado. Desta forma, cumprindo a missão de proteger o que determina o artigo 5º da Constituição que garante o direito fundamental à liberdade religiosa, mediante o projeto da capelã, o comando do 30º Batalhão de Polícia Militar formou o programa que conta com uma equipe treinada e orientada para atender ocorrências envolvendo a intolerância e a violência desferida por extremistas religiosos.
Em entrevista ao Diário, Lilian conta com detalhes como surgiu o projeto e qual o foco principal do movimento. “O programa surgiu após eu ter sofrido por três vezes com o crime de intolerância religiosa. Eu como pedagoga formada resolvi usar como parâmetro o projeto Maria da Penha, construindo um projeto em protótipo de como proceder em caso de crime de intolerância religiosa e principalmente como os a Policia deveria se comportar diante desse crime. Nem todo mundo tem esse conhecimento religioso, do que é sagrado e o que não é, então eu criei esse projeto e a PM transformou em um programa”, explicou a fundadora.
Foco principal
Lilian esclarece o objetivo principal do projeto, destacando o quanto essa conscientização é fundamental. “Nós fizemos um mapeamento muito importante em conjunto com a Polícia Militar e com isso descobrimos o mais importante, que são as subnotificações. Ou seja, pessoas que estavam sofrendo violência religiosa, mas, não sabia que isso era crime. Desta forma, o foco principal é a prevenção e a conscientização da população em saber que qualquer religioso que esteja sofrendo neste âmbito pode e deve ser protegido”, destaca.
Capacitação dos policiais
Lilian também é pós-graduada em Ciências da Religião, com toda a sua trajetória e experiência, ela comanda palestras e cursos que fomentam a aplicação desse programa em todo o estado. “A capacitação dos agentes nesta esfera tem sido muito produtiva. Inclusive, já estamos em todo Estado, recentemente fizemos a capacitação de todos os policiais do CPA, em Sulacap no CFAP, na ocasião eu estava lá dando o curso e orientando sobre o programa. Temos oferecido muitas palestras e estamos expandindo muito, já estamos em todos os CPA’s, todos os Comandos de Área da Policia, e agora a gente vai expandir para a corporação toda”, afirma a capelã.
Lei
Por mais que na teoria as leis contra crimes no âmbito religioso existam, Lilian pontua que na prática ainda é um trabalho árduo de reconhecimento. “A Lei 2.848/1940 no Art 208, diz que a gente tem o direito à religiosidade, e está na previsão da lei até um ano de prisão ou multa, para quem infringir. Entretanto, sabemos que ainda é bem difícil a jurisprudência em torno desse tipo de crime, de forma que ainda é um pouquinho utópico para nós. A lei costuma só ser aplicada em casos extremos, em casos mais graves, quando deveria ser aplicada para todos os casos de intolerância religiosa”, esclarece ela.
Caso recente
A Polícia Civil registrou e está investigando um caso de tentativa de homicídio que envolve também intolerância religiosa em Teresópolis. Em 31 de Janeiro um homem foi preso em flagrante acusado de tentar esfaquear o responsável por um centro espírita. Ele teria invadido o local com o intuito de destruir imagens no espaço, utilizando uma marreta, mas sendo impedido pela vítima. De acordo com o Delegado Titular da 110ª Delegacia de Polícia, o pior só não aconteceu porque vizinhos do templo religioso ouviram os gritos e ajudaram o responsável pelo centro espírita. “Aconteceu isso sim, a pesquisa da Policia ainda está sendo realizada, mas, vale ressaltar que a gente conseguiu algo inédito, pois, a pessoa que cometeu esse crime não tinha passagem pela Policia e mesmo assim a gente conseguiu a prisão dele diante deste ocorrido”, pontua.
Recado
É de suma importância que o respeito seja mútuo, como explica a idealizadora do projeto. “É muito importante respeitar a religião alheia, porém, é essencial que todos façam sua parte. Ou seja, se você tem uma vertente religiosa, que, por exemplo, faz culto à noite, obedeça ao limite de horário. Observe se não há acúmulo de pessoas ou transito excesso de veículos em volta do seu templo religioso, pois, o recado mais importante é: respeite para ser respeitado. Para finalizar, acima de tudo, denuncie caso esteja sofrendo a intolerância religiosa, não deixe o crime chegar ao extremo de brigas e violência, denuncie imediatamente”, ressalta Lilian.
Como denunciar
Para finalizar, Lilian salienta que caso alguém esteja sendo vítima de intolerância religiosa deve expor a situação com a certeza que receberá apoio. “Nós temos um telefone da patrulha religiosa funcional da PM, que é o (21) 96881-7927. É uma patrulha de Policia de aproximação, tanto a comunitária quanto a diversidade religiosa, que hoje a gente tem aqui em Teresópolis. Ressalto que a população pode ligar que a PM vai estar sempre disponível para defender e proteger quem precisar”, destaca.