Max Gomes (IOC/Fiocruz)
Calor intenso, fortes chuvas e grande circulação de pessoas. Características típicas do verão em diversas regiões do Brasil acendem antigos e novos alertas para cuidados de prevenção que devem ser tomados durante a estação mais quente do ano.
Enquanto pancadas de chuva, principalmente em áreas urbanas, preocupam pela possibilidade de inundações e transmissão da leptospirose, a combinação dessas precipitações com o calor constante emerge a necessidade de vigilância redobrada sobre um velho conhecido: o mosquito Aedes aegypti – transmissor de arboviroses como a dengue, chikungunya e zika.
Neste ano, a temporada ainda demanda um cuidado extra pelo recrudescimento da pandemia de Covid-19, com o surgimento da variante ômicron, e a circulação fora de época dos vírus influenza, impulsionada pela nova cepa H3N2 Darwin.
Confira abaixo orientações de especialistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e saiba como se prevenir dessas doenças.
Leptospirose
As enchentes que têm provocado a destruição de cidades país afora, também colocam a população em risco para diversas doenças. Em ambientes urbanos, a principal preocupação é com a leptospirose, infecção causada pela bactéria Leptospira – presente em urinas de ratos. Com os alagamentos, a enxurrada se mistura com dejetos de bueiros e esgotos, facilitando a transmissão desse microrganismo que penetra no corpo humano por meio da pele, sobretudo, se houver algum ferimento.
“Em inundações, o aconselhável é evitar entrar em contato com a água da enchente, permanecendo em local seco e seguro enquanto espera a água baixar. Porém, como nem sempre isso é possível, é importante proteger a pele com luvas e calçados fechados, preferencialmente botas, ou, como alternativa, sacos plásticos cobrindo partes dos pés e das pernas”, recomenda Ilana Balassiano, pesquisadora do Laboratório de Zoonoses Bacterianas, que abriga o Serviço de Referência Nacional para Leptospirose junto ao Ministério da Saúde.
Quando as enchentes avançam para dentro dos domicílios é necessário realizar higienização correta desses locais. A pesquisadora indica que, após a remoção da água, as superfícies sejam higienizadas com um pano umedecido em solução de hipoclorito de sódio (2 xícaras de chá de hipoclorito de sódio – 2-2,5% – para cada 20 litros de água). “Pode ser utilizada água sanitária comercial, que geralmente tem a concentração de 2-2,5% de hipoclorito. No entanto, deve-se certificar se, no rótulo, os componentes sejam apenas água e hipoclorito. Se houver substância adicionais, o uso não é recomendado”, destaca Ilana.
Muitas vezes, além do transtorno e da sujeira, os alagamentos provocam a destruição de alimentos. “É um momento delicado para quem vive esse cenário, mas o ideal é que seja feito o descarte de todos os alimentos perecíveis (como verduras, legumes e frutas), pois são facilmente contaminados. Também é recomendado que sejam descartados produtos industrializados embalados em plástico ou papelão, visto que esses recipientes apresentam alto risco de perfuração”, alerta a pesquisadora.
Já os alimentos industrializados em embalagens de alumínio e vidro, e utensílios domésticos, podem ser lavados com água e sabão e desinfetados com hipoclorito de sódio (2 colheres de sopa para cada litro de água). “Se esses produtos estiverem lacrados e não sofreram danos, a desinfecção deve ser feita imergindo o enlatado ou utensílio na solução de hipoclorito por 30 minutos – de preferência, em recipiente fechado. Após esse processo, o alimento ou utensílio deve ser lavado em água própria para consumo”, conclui.
A incubação da leptospirose acontece entre um período de 5 a 14 dias, com os primeiros sinais da infecção sendo semelhantes aos da dengue ou de um resfriado, como febre, dores de cabeça e no corpo. Sendo assim, é fundamental que, ao procurar um posto de saúde por causa desses sintomas, o paciente que teve contato com águas de alagamentos relate o acontecido para que seja feito o diagnóstico diferencial e um tratamento adequado.
Covid-19 e influenza
Com a pandemia da Covid-19 e a circulação fora de época dos vírus influenza (saiba mais aqui), a temporada atual do verão também traz um alerta para disseminação dos vírus respiratórios. Por ser um período de férias escolares, festividades e alta temporada de viagens, os cuidados com a prevenção, já conhecidos pela população, se tornam ainda mais importantes.
“A vacinação é a principal forma de prevenção que temos atualmente para ambas as infecções. Em adição, nos últimos anos, nós desenvolvemos mecanismos bastante poderosos para a prevenção de vírus respiratórios, que são as medidas não-farmacológicas. Entre elas, o uso de máscaras, distanciamento social, etiqueta respiratória e a higiene constante das mãos”, destaca Fernando Motta, pesquisador do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo.
A influenza, popularmente conhecida como gripe, e a Covid-19 possuem sintomas semelhantes, com peculiaridades que diferem uma da outra. Ambas as infecções causam febre alta, dores de cabeça, tosse, coriza, mal-estar, entre outros. Desta forma, para os casos que vão além dos sintomas leves, é necessária a realização de testes para identificação do agente infeccioso e a realização de um tratamento direcionado.
Em todos os quadros, o distanciamento social é essencial para evitar a disseminação das duas infecções. “Se você estiver com sintomas, ou for assintomático, no caso da Covid-19, evite ter contato com outras pessoas e use a máscara sempre que possível”, ressalta Motta.
Campanhas de vacinação para Covid-19 e para a Influenza são promovidas pelo Ministério da Saúde. É importante acompanhar o plano nacional de imunização (PNI) e os calendários específicos dos municípios para garantir a atualização correta desses imunizantes.
Arboviroses transmitidas pelo Aedes aegypti
A prevenção de dengue, chikungunya e zika ocorre pela já conhecida ação semanal de interrupção do ciclo de vida do mosquito Aedes aegypti, a partir da eliminação de locais que podem acumular água parada, como vasos de plantas, bandejas de ar-condicionado, piscinas não utilizadas, dentre outros.
“Com a chegada do verão, época propícia para a formação de criadouros do Aedes, precisamos redobrar nossa atenção. Cada fêmea pode colocar até 1.500 ovos, por isso é importante olhar a casa com ‘olhos de mosquito’, procurando todo e qualquer local que acumule água e possa ser usado para reprodução do vetor”, alerta Denise Valle, pesquisadora do Laboratório de Biologia Molecular de Flavivírus.
De acordo com o primeiro Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde de 2022, houve um acréscimo de 32,7% nos casos prováveis de chikungunya em 2021 quando comparados com o mesmo período em 2020.
“Quanto maior a quantidade de mosquitos, maiores são as chances de transmissão desses vírus. Todos os anos reforçamos a mensagem de que a fêmea do Aedes espalha seus ovos por diversos locais. Não podemos nos tranquilizar e encerrar a verificação se no primeiro ambiente já forem encontrados ovos ou larvas. Na verdade, devemos ficar ainda mais alertas e procurar mais atentamente em locais próximos, pois certamente haverá outros criadouros. É muito mais fácil você combater uma larva que está confinada em um espaço do que um mosquito que está voando”, salienta Denise.
A principal recomendação é eliminar qualquer recipiente que possa acumular água. No entanto, se não for possível o descarte, a orientação é que sejam devidamente vedados ou, ainda, tratados. A vistoria semanal deve incluir criadouros menos convencionais, como calhas de chuva, ralos externos, vasilhas de animais, bandejas de geladeiras, entre outros.
“O Aedes é um mosquito doméstico. De cada dez criadouros, oito estão dentro das residências. Então, se as pessoas estão passando mais tempo em suas casas por causa da pandemia da Covid-19, elas possuem mais oportunidades de olhar com cuidado os seus espaços e evitar que mais vírus estejam em grande circulação. Precisamos transformar a ameaça em oportunidade”, conclui a bióloga.