Anderson Duarte
O fim de semana estava quase perfeito: cidade cheia de turistas, clima tipicamente teresopolitano, hotéis e pousadas comemorando excelente ocupação e manchetes em O DIÁRIO falando de prosperidade e potencialidade de crescimento com novos investimentos e empreendimentos no município. O clima era mesmo de muita esperança de dias melhores e um novo destino para a sofrida Teresópolis. Mas, o experiente jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira, surge através do seu programa na GloboNews, como uma espécie de balde de água fria nas prospecções otimistas e joga à nossa frente um cenário real de corrupção enraizada e um setor público capaz de manipular, distorcer e vilipendiar, em nome do vil metal e a custas do empobrecimento e desorganização da estrutura administrativa, para enriquecer ainda mais. Pelas ruas, Gabeira quer saber: por que a cidade não reage a tantas irregularidades?
Aliás, uma excelente pergunta, e que todo cidadão de bem, e que não guarda, ou nem pretende guardar, envolvimento com qualquer tipo de ilícito se faz diariamente. A chamada do programa alerta para “um estranho escândalo que tomou conta de Teresópolis”, segundo ele, “… as investigações revelam pagamento de propina em uma licitação para garantir a administração de um cemitério e outras vantagens indevidas para conseguir o controle de estacionamentos. Teresópolis é um polo de atração turística e de casos inusitados. A Câmara da cidade aprovou um projeto de lei que permite a terceirização de serviços como a administração de cemitérios. O que a sociedade civil acha disso?”, questiona o programa. E muita gente respondeu ao jornalista com a mesma certeza e descontentamento que vemos estampados em nossas enquetes diárias.
Com depoimentos contundentes, inclusive do próprio Tricano em um passado recente, já que não mais dá entrevistas que não para suas empresas de comunicação, hoje mantidas com a preciosa ajuda do trabalho de nomeados a cargos públicos, a população não consegue explicar como chegamos a este ponto de denúncias intermináveis e prestes a cassar mais um prefeito, o terceiro Chefe do Executivo a experimentar tal sensação. Em sua cabeça de abertura Gabeira pergunta ao telespectador: “Depois de enfrentar uma crise tamanha motivada pela tragédia de 2011, o município cassa um prefeito acusado de corrupção, e depois desta experiência toda, elege um sujeito comprovadamente ficha suja pelo tribunal eleitoral?”, indaga o jornalista. E claro que não temos esta resposta na ponta da língua. Vão dizer os mais apocalípticos que não sabemos mesmo votar, que foi o medo e a intimidação de um criminoso que se reverteu em tantos votos, que foram os adversários ruins que levaram a uma vitória nas urnas, e há até quem diga que a culpa é mesmo da Justiça, que o permitiu ilustrar uma urna, quando na verdade o político estaria mais para ilustrar cartazes de “procurado” da polícia fluminense. Enfim, ninguém tem coragem de responder.
Neste cenário trágico de escândalos envolvendo terceirizações, em escutas escabrosas que ilustram a relação promiscua entre Legislativo e Executivo e um Judiciário que espalha ao vento liminares e mais liminares aos que estão acostumados sempre a encontrar atalhos entre as normas, quem paga mesmo a conta é a população, como bem lembra o polêmico jornalista e político de postura firme Fernando Gabeira. E os inúmeros malefícios são comprovados em números como, por exemplo, o recente dado divulgado pela OMS que aponta para um prejuízo de bilhões de reais ano com a corrupção em cidade pequenas e médias, com ênfase nos mais de 70% dos desvios concentrados nas áreas de saúde e a educação. Segundo outro levantamento feito em 2017 com dados do Ministério da Transparência, em 730 cidades brasileiras, os desvios de verbas federais desde 2003 significaram um prejuízo estimado de quatro bilhões de reais aos cofres municipais. Somente com os hospitais de Teresópolis, o calote tricanista registra cerca de quarente milhões de reais.
Aliás, é praticamente impossível dimensionar o total de recursos públicos desviados em fraudes e corrupção em todos os 5.570 municípios do país. Somente o que foi descoberto e investigado pelas autoridades nos últimos três anos ultrapassa a casa de vinte bilhões de reais e são crimes que não tiveram a mesma visibilidade que a Operação Lava Jato, mas cujo impacto é ainda mais devastador. Não é por acaso, mas algumas dessas cidades ostentam os piores Índices de Desenvolvimento Humano, ou o IDH, de todo o Brasil. E as áreas de saúde e educação foram alvo de quase 70% dos esquemas de corrupção e fraude desvendados em operações policiais e de fiscalização do uso de verba federal pelos municípios nos últimos anos. Os desvios evidenciam como recursos destinados a essas duas áreas são especialmente visados por gestores municipais corruptos. Vide os temerosos contratos com Organizações Sociais de Saúde, praticamente personagens principais desta novela de mau gosto. Essas organizações criminosas tiram recursos públicos de quem mais precisa para alimentar esquemas criminosos milionários e luxos particulares.