Nos últimos anos, a revolução digital transformou profundamente a forma como trabalhamos. Escritórios físicos deram lugar a home offices, equipes se conectam de diferentes países e tarefas são distribuídas por aplicativos e softwares de gestão automatizados. No centro dessa transformação, surge uma nova figura: o algoritmo como “gestor invisível”.
No contexto digital, a subordinação pode se dar por meios tecnológicos, quando o profissional segue orientações, metas e avaliações definidas por sistemas automatizados ou algoritmos de gestão.
Muitos profissionais do setor digital, tais como: programadores, designers, analistas de dados, desenvolvedores de software, acreditam estar livres da subordinação típica do emprego tradicional, trabalhando de forma “autônoma”, muitas vezes por meio de contratos de prestação de serviços ou CNPJs individuais.
Contudo, há um fenômeno crescente e preocupante: a subordinação algorítmica, em que o controle do trabalho se dá por meio de sistemas inteligentes, capazes de monitorar, avaliar e até sancionar comportamentos profissionais.
Recentemente o noticiário divulgou que uma grande instituição bancária demitiu cerca de mil funcionários que atuavam em regime híbrido ou remoto após monitorar, por meio de softwares internos ao longo de aproximadamente seis meses, a produtividade desses colaboradores — medindo dados como número de cliques, abertura de abas, uso de memória e tarefas incluídas no sistema — e verificar uma “incompatibilidade entre a marcação de ponto e a atividade registrada nas plataformas de trabalho”
Ferramentas de produtividade e inteligência artificial conseguem rastrear o tempo de execução de tarefas, frequência de logins, ritmo de digitação, e até prever o desempenho futuro com base em dados coletados em tempo real.
Na prática, o algoritmo “decide” quem recebe mais tarefas, quem é avaliado como mais produtivo e até quem será “desconectado” do projeto.
Esse tipo de controle, ainda que sutil, revela uma subordinação moderna, diferente da clássica, mas com o mesmo efeito jurídico: o trabalhador perde sua autonomia e passa a seguir comandos — agora emitidos por softwares e sistemas automatizados.
A subordinação é uma das principais características do vínculo de emprego, prevista no artigo 3º da CLT. Ela se manifesta quando o trabalhador se coloca sob as ordens e direção do empregador, ainda que esse controle não seja presencial ou direto. É justamente esse elemento — o poder de comando — que distingue a relação de emprego da mera prestação de serviço autônomo.
Enquanto as empresas se reinventam com o uso de IA, o ordenamento jurídico ainda busca se adaptar. Há quem defenda a criação de uma nova categoria de trabalhador digital, com proteção intermediária entre o autônomo e o empregado.
Outros sustentam que a CLT já é suficientemente ampla para alcançar essas relações, desde que interpretada à luz da função social do contrato de trabalho e do princípio da solidariedade (art. 3º, I, CF/88), que impõe à sociedade o dever de proteger o trabalho humano contra formas modernas de exploração.
No entanto, conforme o princípio da primazia da realidade que norteia o direito do trabalho, havendo a presença das características do vinculo de emprego, ainda que mascaradas de “pejotização” ou “prestação de serviços autônomos”, há de ser reconhecido o vinculo empregatício e garantido os direitos trabalhistas destes trabalhadores.
A inteligência artificial não é inimiga do Direito, pelo contrário, pode ser sua aliada. No entanto, faz-se necessário vigilância ética e jurídica para que o avanço tecnológico não sirva de escudo para a precarização da mão de obra e dos direitos trabalhistas conquistados durante longos anos.
No fim, a subordinação algorítmica é apenas uma nova roupagem para velhos dilemas: quem controla, quem depende, quem se beneficia. E, enquanto houver trabalho humano envolvido, deve haver também direitos humanos e trabalhistas resguardados.
Se você se encontra nestas situações e possui duvidas, procure um advogado especializado na área, um olhar técnico pode identificar se há indícios de vínculo empregatício e garantir a proteção jurídica adequada à sua realidade profissional.
Helena Gonzaga Daflon Gomes, inscrita na OAB/RJ 240.843, advogada formada pelo Centro Universitário Serra dos Órgãos – UNIFESO, pós graduanda em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário pela PUC MG, presidente da Comissão do Direito do Trabalho da 13º subseção da OAB/RJ. Atuante no âmbito Trabalhista, com especialização em Contratos e Negociações Preliminares pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Departamento Pessoal pela ESA/SP





