Wanderley Peres
“Nunca vi, nem comi, eu só ouço falar”. É claro que agora o Zeca Pagodinho já sabe, mas quando tornou sucesso a música de Luiz Grande, vinte anos atrás, o cantor deixou claro que não sabia o que era caviar. Muita gente em Teresópolis aliás, que não sabia, já sabe também o que é caviar. Até alguns que vendiam o almoço para conseguir jantar, como dizem lá em Minas. Privilegiados seres alojados na administração municipal com o pomposo título de servidor, ignoram que estão nos cargos públicos para servir o público e não se servir dele, levando a cidade ao caos com as suas corrupções. E depois de experimentar o caviar, puderam esses privilegiados conhecer também outro exotismo: o coach. Ou “coaching”, termo inglês que preferem esses ilustrados vendedores de facilidades. E conheceram justamente o mais famoso e caro deles, a quem o prefeito Vinícius Claussen tem por excelente ídolo.
Mas, você sabe o que coaching?
Não é de comer, nem nunca vi também, mas dá para perceber bem o estrago que faz nas mentes dos seus discípulos, que são os “coachees”, esses tipos cada dia mais comuns que nos cumprimentam com aquele tão falso “excelente dia”, quando um sincero e gostoso “bom dia” já seria mais que o suficiente. O coaching, ou coach, é o mesmo que “treinador”, “instrutor” ou até professor, diriam, embora a qualificação não deva ser usada porque a profissão não é regulamentada no Brasil. Coaching, sinceramente, é aquele sujeito empolado que vende até gelo para esquimó tão convincente que flui sua pregação mansa e cheio de trejeitos.
Quem não se lembra da farra dos secretários municipais e seus subsecretários em São Paulo aonde foram acompanhados do prefeito para assistir uma palestra motivacional de quatro dias às custas de dinheiro público, conforme noticiou O DIÁRIO em manchete no dia 3 de novembro passado? Um escândalo, orgia que não deu em nada, nem foi investigada pelos vereadores. Mas aquele desperdício de dinheiro público denunciado pelo nosso jornal era ínfimo o valor diante do que estava sendo engendrado nos bastidores. A toque de caixa, depois desse evento, a prefeitura contratou a empresa do palestrante bom de bico que tanto agradou o secretariado naqueles dias de lazer. Dejavu da trama de novembro passado, a publicação do edital de contratação de um curso em uma ONG de Minas Gerais foi o fio da meada que expôs suposta paga aos aliados políticos do prefeito, que abriram as portas da igreja envolvida durante o período da campanha de reeleição.
“Três coisas não podem ser escondidas por muito tempo: o sol, a lua e a verdade”.
Tivesse lido Buda, e soubesse da convicção do DIÁRIO, a secretária de Educação não mentiria em resposta sobre o caso quando afirmou em Nota que era “importante deixar claro que o coach Paulo Vieira não faz parte do quadro societário da empresa contratada”, ressaltando que “o termo de colaboração firmado é entre o Município de Teresópolis e o Instituto ASSEP, e eventuais parcerias deste Instituto com outros não englobam o termo em questão”.
Uma simples consulta na internet revelou a mentira. Embora, de fato, até onde se sabe, a prefeitura não tenha contratado o “master coach” neopentecostal Paulo Vieira, criador do “Método CIS” (Coaching Integral Sistêmico), para comprar do amigo do prefeito os seus livros ou suas palestras, porque a empresa vinculada à ONG Servindo e Protegendo é a “Febracis Assinatura e Comércio de Livros Ltda.”, essa empresa que figura no contrato firmado pela Prefeitura tem como sócio administrador a “Newco Participações Ltda.”, empresa que pertence a Paulo Sérgio Vieira e sua esposa, Camila Campos Saraiva e Silva.
É imoral essa contratação porque está flagrante a promiscuidade. E inoportuna também, considerando que o mau estado das estradas do interior não permitem os ônibus chegarem a diversas escolas nos dias de chuva. Prioridade também não é, até porque temos várias escolas fechadas por falta de reformas e manutenção. Se é ilegal, no entanto, é questão para o Ministério Público apurar. Ou os vereadores, que tem essa obrigação e, aparentemente, já se movimentam no sentido de fiscalizar o imbróglio noticiado. A prefeitura tem sua versão, e deve dá-la em entrevista prometida a DIÁRIO para esta quinta-feira, 23, quando o secretário de Administração, Lucas Homem, será ouvido pela redação.
Enquanto a administração municipal arranja argumentos para convencer a população de que nada existe de errado, ou que, se existe esses erros serão sanados, depois das falas de vários vereadores na última sessão da Câmara, onde um deles chamou o setor de licitações da Prefeitura de “balcão de negócios” e as comissões de Educação e de Servidores Públicos da Casa foram acionadas pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais, o GT de Literatura do Fórum Municipal de Cultura de Teresópolis, através de sua coordenação, em nome da classe artística ligada à literatura da cidade, lançou nota de repúdio veemente à compra dos livros motivacionais. “Esta coordenação entende que o investimento em literatura para o ensino é fundamental para a cultura e para a transformação da sociedade, mas entende também que em uma cidade que possui centenas de escritores que também sofreram com a pandemia da COVID 19, esta monta seria muito importante para estas famílias, bem como, o valor investido na cidade, faria este dinheiro circular, possibilitando investimento na economia local e um maior recolhimento de impostos a serem reinvestidos na própria cidade”, assinou o acadêmico da ATL, escritor Gustavo Lucena, que assina a nota em defesa dos autores locais.
Foto: Sem divulgação, a palestra para os secretários em São Paulo foi sabida da população depois que o vereador licenciado Estufa divulgou vídeo mostrando a farra com dinheiro público enquanto as estradas estavam intransitáveis por conta das chuvas no feriadão criado pelo prefeito no dia de Finados.