Luiz Bandeira
Em 26 de junho passado, ainda durante a madrugada, foi detectado um incêndio consumindo o lixo acumulado no depósito do Fischer, e até hoje, 25, o fogo não parou de queimar. Mesmo com o empenho integral do Corpo de Bombeiros com apoio da Cedae, Defesa Civil, secretarias municipais de Meio Ambiente, Obras e Serviços Públicos, Saúde, Segurança Pública, além do Desenvolvimento Social, para extinguir as chamas e assim minimizar os transtornos para a cidade, não foi possível dar fim ao fogo que agora parece consumir material compactado por baixo da superfície do Lixão. Desde os primeiros momentos do incidente, na maioria dos bairros na zona urbana do município, era impossível não sentir os efeitos da fumaça que tomou toda da atmosfera deixando uma névoa tóxica no ar. Temendo sofrer danos à saúde, muitas pessoas precisaram evitar sair de casa, quem teve que ir para a rua precisou usar as máscaras, tão comuns no período da pandemia, revivendo o terror dos tempos sombrios de Covid-19. A recomendação era de manter janelas e portas fechadas impedindo que a fumaça tomasse conta do ambiente e quando esse recurso não era possível, quem pôde se abrigou na casa de parentes ou amigos mais distantes do problema. No entanto ninguém sofreu mais com a fumaça tóxica gerada pela queima do lixo acumulado no Lixão do Fisher do que os moradores vizinhos ao aterro sanitário, e o Condomínio APA Rainbow é o conjunto habitacional mais próximo ao depósito municipal, local onde moradores nos relataram as dificuldades enfrentadas neste último mês.
Em entrevista nesta terça-feira, 25, Anna Lídia, mãe de três crianças, revelou o quanto sua família vem sofrendo com o problema. “São 31 dias de sofrimento, todo dia tem fumaça, ela se mistura a neblina e se você deixar dois dedos de uma janela aberta, você não consegue ficar dentro de casa. Muita dor de cabeça, já fui para o hospital, remédio, tenho três filhos e o meu menorzinho de três anos está sofrendo bastante, usando bombinha de SOS, medicação contínua, por conta da fumaça, ele que nunca teve nada”. Anna explica que à noite, quando esfria, a fumaça fica mais evidente. “Vai esfriando vem o cheiro e aí vem junto a neblina e quando vai amanhecendo e o sol esquenta aí a fumaça parece que sobe junto com a neblina, mas todo dia ela volta à noite”.
Monitoramento
Dois dias após o início do incêndio, o INEA instalou no Condomínio APA Rainbow um conjunto de aparelhos de medição da qualidade do ar, para monitorar e enviar em tempo real os parâmetros meteorológicos e as concentrações de poluentes dispersos no ar para o Instituto. “Hoje eu questionei no grupo do condomínio essa questão. Porque está aqui desde dois dias depois do início do incêndio já estavam instalando e até hoje, eu como moradora, não recebi nada, não tem nada escrito por eles do que a gente está respirando, qual o tipo de contaminação, porque com certeza tem coisas muito pesadas e a gente não tem conhecimento do que a gente pode ter futuramente pelo ar que a gente está respirando aqui”.
Abandono
A vizinha do aterro do Fischer se revolta com a sensação de abandono. “Eu por conta de trabalho não pude sair da cidade, aí tive que ficar, fiquei em um hotel na cidade, assim que pude eu fui para o Rio de Janeiro. Eu fiquei oito dias fora da minha residência, achando, acreditando que o poder público fosse fazer alguma coisa e hoje fazem 30 dias que estamos abandonados, nada foi feito. Foi um paliativo, mas de fato nada resolvido”.
Outro relato muito comovente é o da aposentada dona Eliane Mesquita, que saiu de casa para evitar problemas de saúde, mas ao voltar percebeu que o problema com a fumaça persiste. “A minha preocupação é quanto à contaminação ao tipo de gás que estamos respirando, porque são vários tipos de lixos que são despejados ali, inclusive eu soube que até lixo hospitalar. Me preocupo com o que estamos respirando, fiquei dez dias fora porque não tinha condições de ficar aqui, retornei e continua o cheiro forte”.
Mais problemas
A proximidade do Condomínio APA Rainbow com o aterro do Fischer fez com que os moradores se habituassem à infestação de moscas que acabam indo para as residências, mas segundo relato de Alessandra Costa, outra moradora que conversou com a nossa reportagem, agora está insuportável. “Estamos vivendo enclausurados, porque a fumaça começa em um período da noite e de manhã terrível, então temos que viver com a casa fechada, por causa do cheiro da fumaça, por que entra contamina e tem a questão da mosca também, porque a gente aqui tem normalmente o problema da mosca, mas nessa época de inverno ameniza um pouco, só que agora, depois que aconteceu tudo isso aqui, que esse descarte do lixo aqui, com essa coisa toda que eu não sei o que está acontecendo a mosca simplesmente triplicou. Domingo fui fazer churrasco na minha casa, passei vergonha, era muita mosca, o chão ficou preto de mosca é insuportável. Você não pode respirar, eu sinto dor de cabeça todos os dias por causa da fumaça, aí você abre a casa é fumaça é a mosca, você tem medo de comer uma mosca, de tomar uma mosca no suco ou em um copo d’água, você tem que viver assim, está impossível, difícil, complicado, a gente precisa de uma solução”.
Transbordo do lixo
Toda a repercussão nacional que o incêndio causou acabou agilizando o processo de implantação do plano para acabar com os lixões no país, como prevê a lei federal n° 12.305 de 2010. A lei estabeleceu um prazo final até 2014 para acabar com os depósitos inadequados e cerca de três mil lixões a céu aberto que continuam espalhados em mais da metade das cidades brasileiras. Como Teresópolis não conseguiu se adequar ao que determina a lei, o lixo continuou sendo acumulado no depósito municipal por força de liminar. O governo alegou que conta com repasses do estado para viabilizar a operação de transbordo do lixo gerado em Teresópolis para um aterro licenciado em outro município e que esse seria o início da solução definitiva do lixo. O plano prevê ainda que será construída uma usina, com recursos da iniciativa privada, que vai fazer a queima química do lixo, gerando energia. A expectativa é de que em um futuro breve, o espaço que durante anos serviu para acumular lixo, será totalmente recuperado.