O dia 30 de maio de 2024 vai ficar marcado negativamente para a família de Ester Teixeira Pires, de 61 anos. Foi nessa data que a moradora do Bairro de São Pedro saiu de casa para nunca mais voltar. Logo após começar a se sentir mal, ela foi levada para a Unidade de Pronto Atendimento, a UPA, na Rua Tenente Luiz Meirelles, mas o serviço prestado na porta de entrada do SUS no município ficou aquém do esperado – segundo o relato dos familiares de Ester em conversa com a reportagem do Diário na manhã desta segunda-feira (10). Eles procuraram nossa redação para denunciar o que entendem como negligência médica no atendimento a uma paciente que necessitava de intervenção rápida para evitar o agravamento do seu quadro. O fato, inclusive, foi registrado na 110ª Delegacia de Polícia no dia 1º de junho.
De acordo com a filha Carla Teixeira Pires de Almeida, Ester estava vomitando, se queixando de dor no braço e dor na lombar, irradiando para a perna, além de muita falta de ar. Ainda segundo ela, já na “Classificação de Risco” foi informado sobre seu problema de saúde, fibrilação artrial, e apresentado um eletrocardiograma. Porém, ela teria apenas recebido remédio para dor e relaxante muscular, ficando mais de uma hora na sala de medicação, sem sinal de melhora.
“Em seguida a levamos para a sala do médico e frisamos novamente o problema, mostramos o eletro e ele pediu um novo eletro, peguei e só depois falou que estava com ataque cardíaco e teria que ir para a sala vermelha. Chamamos o enfermeiro, a levamos com muita falta de ar. Fui junto até a porta da sala, dali não vi mais minha mãe. Ainda fiquei perto, rodeando, por uns 20 minutos, só colocaram ela na maca e saiu todo mundo. Vi um médico sentado Sala Vermelha e só tinha mais uma paciente”, relata Carla Pires. “Nesse primeiro atendimento ele não auscultou, não botou a mão nela nenhum momento. A pessoa chega com dor no braço, falta de ar, aí pega e dá remédio para dor e relaxante? Olha o tempo que minha mãe perdeu lá dentro”, completa, emocionada.
Agravamento
Outra filha, Crislaine Teixeira Pires de Almeida assumiu a responsabilidade de acompanhar a mãe. Ou pelo menos tentar, pois, segundo ela, a partir do momento da entrada na Sala Vermelha ficou mais difícil o contato. Porém, Crislaine relata ter visto, pela brecha da porta, a mãe aparentemente ainda muito mal e na mesma posição deixada pela sua irmã. “Vi minha mãe sussurrando, não vi nenhum medicamento, soro, nada, só com acesso, sem nada ainda chegou a sussurrar chamando um enfermeiro, que demorou a chegar. Foi o que vi alie e comecei a entrar em desespero. Até mandei mensagem para minha irmã informando que não tinha enfermeiro perto, médico, nada”, pontua, informando ter sido a seguir orientada pela assistente social a ir embora “pois estava muito frio”.
Vinte minutos depois, porém, a notícia que eles não queriam ouvir, sobre o óbito de Ester. “Como uma pessoa chega com muita falta de ar, todo o histórico de doença, e não colocaram em um balão de oxigênio? Colocaram no histórico que entubaram ela, mas vi que não entubaram nada. Queremos uma resposta da secretaria de Saúde, das autoridades, dos gestores, queremos uma resposta e não vamos parar enquanto não tivermos essa resposta. Isso não vai trazer nossa mãe, pode evitar que aconteça com outra pessoa”, enfatiza.
Falta de tato
Além de questionar a demora para o atendimento especializado pelo quadro e exames anteriores apresentados, Carla reclama de como foi tratada pelo médico. “Depois da medicação voltei lá e questionei sintomas. E sabe o que falou? Que ela estava um pouco acima peso e a dor puxando perna poderia ser nervo ciático. Falou muito bem para mim, mesmo com o eletro na mão, na Sala Vermelha, onde atendimento deveria ser urgente, de emergência. Simplesmente colocaram minha mãe deitada e lá ela ficou, e lá ela morreu se tivesse dado atendimento adequado não teria morrido. Ela chega com todos os sintomas de ataque cardíaco, aí dão remédio para dor e relaxante, como assim?”.
Uma história interrompida
Casado com Ester por 45 anos, Antônio Carlos Almeida não se conforma de ter perdido sua companheira de vida em uma situação que, no seu e no entender de toda a família, poderia ter acabado de maneira muito diferente se houvesse investimento por parte do governo municipal na saúde em Teresópolis. “Como pode existir um lugar daqueles? Não tem equipamento, não tem atendimento digno, tratam as pessoas como lixo, como nada tivesse acontecido. Vivemos em uma cidade bilionária, mas isso não retorna na saúde. Atendimento médico hoje só vale para quem tem dinheiro, para quem tem médico particular. Isso é responsabilidade do prefeito, ele tem que representar isso. Se ele é empresário, se tem grande restaurante, como não poderia apostar na saúde? Não, por ele pode morrer gente todo dia. Estou passando um momento muito difícil, estou tomando remédio, não quero ver isso todo dia com outras pessoas. Como o prefeito vê isso e não faz nada? Aquilo ali tinha que acabar”, reforça Antônio Carlos.
“Gestão” silencia mais uma vez
Logo após conversar com os familiares de Ester, ainda muito abalados por uma perda tão recente e significativa, cobramos um posicionamento da secretaria municipal de Saúde, através da assessoria de comunicação da prefeitura. Porém, apesar da gravidade do fato, e inclusive citada a informação de apuração em esfera policial, a “gestão”, como gosta de ser chamado o governo Vinicius Claussen, não se pronunciou. Aliás, nas últimas semanas têm sido esse o posicionamento da prefeitura: não responde as demandas da população e teresopolitana e, apesar de todas as evidências apresentadas, prefere posteriormente ir para redes sociais chamar tudo o que lhe desagrada de “fake news”.