Wanderley Peres
Sem informar como conseguiu a proeza de convencer a União Recicláveis a continuar transportando o lixo, e ignorando que também está em atraso com os pagamentos da empresa Inova, que faz a coleta, o governo municipal publicou Nota na tarde desta sexta-feira, 6, para informar que o processo de transbordo de resíduos será normalizado a partir deste sábado, 7. “Apesar dos desafios enfrentados, como sequestros judiciais, precatórios e restrições financeiras, o município tem se dedicado a garantir a continuidade de serviços essenciais, que antes não existiam e hoje são indispensáveis”, mentiu sobre a administração, afinal o município dobrou o orçamento dos últimos seis anos para cá, saindo de um orçamento anual inferior a R$ 500 milhões em 2019 e chegando a mais de R$ 1 bilhão em 2024, daí tanto esbanjamento de dinheiro público, inclusive com a contratação do transbordo, porque é solução desnecessária se o governo tivesse feitos os investimentos necessários para a destinação correta do lixo, como fizeram outros municípios do mesmo porte ou menor.
Vazadouro de detritos que foi transformado em aterro controlado entre os anos de 2007 e 2012, e retornou à condição de lixão até ser fechado pelo Inea em 2018, sendo reaberto por liminar que o prefeito conseguiu junto ao juízo da Comarca, depois de ser encerrado, definitivamente, em junho de 2023, pelo Tribunal de Justiça, o Lixão do Fischer havia sido novamente reaberto, desta vez sem liminar ou decisão do Tribunal que permitisse a utilização do espaço para depositar lixo. O local, que estava permitido para o transbordo do lixo coletado no município pela empresa Inova Ambiental, desde a quarta-feira, 4, vinha recebendo o lixo coletado na cidade, depois que a empresa responsável pela segunda etapa da coleta, a União Reciclagem, parou com o serviço de carregamento e transbordo, por falta de cumprimento do contrato pela Prefeitura.
A decisão de reabrir o lixão, e em descumprimento à determinação que o fechou depois de pavoroso incêndio em junho do ano passado, tragédia ambiental que foi notícia no mundo inteiro, afinal aconteceu na cidade sede da Seleção Brasileira de Futebol e na Capital do Montanhismo Nacional, expõe a inconsequência do mau governo municipal, que descumpriu contrato que fez, para o transbordo do lixo, reabrindo o vazadouro, aparentemente, em descumprimento da decisão judicial.
Em Nota, ao ver os caminhões cheios de lixo sem ter onde vazar, na quarta-feira, o prefeito afirmou que a empresa não poderia ter parado o serviço porque a Prefeitura nada deve há mais de dois meses, contrariando o que está publicado no seu próprio Portal de Transparência, onde os débitos com a empresa do transbordo são da ordem de R$ 6 milhões. Segundo o Portal, além das faturas vencidas em novembro, 05-11, no valor de R$ 176.391,20; e as vencidas em 31-10, no valor de R$ 337.186,36; 17-10, no valor de R$ 357.173,60, e duas em 17-10, no valor total de R$ 4.000.000,00, a Prefeitura deve ainda faturas vencidas em agosto, dia 15, no valor de R$ 1.008.195,35 e outra de julho, vencida no dia 19, no valor de R$ 279.750,00. “A Prefeitura de Teresópolis informa que notificou a empresa União Recicláveis Rio Novo LTDA, responsável pelo transbordo de lixo no município, esclarecendo que, apesar do atraso em uma das faturas, não há justificativa ou fundamento legal para a interrupção do serviço. De acordo com a legislação aplicável aos contratos com entes públicos, a paralisação só é permitida em caso de atraso superior a 2 (dois) meses, o que não ocorre neste caso”, escreveu o prefeito.
Lembrando que jamais interrompeu o serviço contratado, a União disse à imprensa que informou ao município em 3 de dezembro, por notificação extrajudicial, que faria “a suspensão dos serviços a partir do dia 4 de dezembro caso os débitos em aberto não fossem quitados, pois a empresa não poderia mais permanecer cumprindo com os custos/despesas/obrigações pela prestação dos serviços contratados dada a desídia do Município com as obrigações que contratualmente assume”, nada respondendo a Prefeitura, que nem teria se proposto a negociar uma forma de pagamento dos valores em aberto, parcelada que fosse, para que o serviço fosse retomado e mantido. “Permaneceu silente o Município acerca de qualquer proposta de pagamento de valores em aberto, solicitando apenas que o serviço fosse retomado e que em data futura fossem acordadas as pendências existentes, o que não atende as demandas da empresa”, disse a União Recicláveis.
Fruto do descaso de várias administrações para o problema do lixo, o Lixão do Fischer é assistido pelo MPRJ desde a década de 1990. Em 1995, a 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Teresópolis propôs a ação civil pública nº 0000320-38.1995.8.19.0061. À época, o objetivo era que, por meio do Poder Judiciário, o poder público adequasse o local onde até então funcionava um lixão a céu aberto, transformando-o em um aterro sanitário controlado, objetivo que foi parcialmente alcançado em 2008, ocasião em que, por meio de recursos do Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (FECAM) e do Fundo Nacional da Saúde (FNS), foi formado um consórcio entre os Municípios de Teresópolis, Carmo, Sumidouro e São José do Vale do Rio Preto para que os resíduos sólidos de todas essas cidades fossem destinados ao aterro em Teresópolis. Entretanto, o local nunca esteve plenamente adequado e a ação civil pública continuou em fase de execução com o objetivo de que tais pendências fossem solucionadas, enquanto os problemas só aumentaram com o abandono do lixão ao longo dos governos Arlei e Tricano. Devido aos tantos anos de omissão administrativa, a vida útil do aterro controlado foi significativamente reduzida, ocasionando o cenário que o levou à interdição no primeiro mês do governo Vinícius, em julho de 2018, condição que piorou significativamente até cinco anos depois, quando pegou fogo em junho de 2023 e o local foi fechado, de vez, pelo Tribunal de Justiça, quando foi cassada a autorização precária concedida pelo juízo da Comarca ao prefeito Vinícius cinco anos antes, quando o prefeito prometeu soluções mirabolantes para o problema, como “estudo, projeto e solução final, em três anos”.
Nesta decisão de 2018, no bojo da ação civil pública 0000320-38.1995.8.19.0061 o juízo da 1ª Vara cível de Teresópolis deferiu a suspensão do ato administrativo do INEA, que havia fechado o lixão no primeiro mês do governo Vinícius Claussen, em 2018, permitindo provisoriamente a manutenção da operação no atual lixão municipal, liminar derrubada pela decisão da 13ª Câmara Cível, no Agravo de Instrumento no. 0023895-53.2021.8.19.0000:
“Tudo isso restou corroborado pelo incêndio ocorrido ontem, 26/06/23, no lixão, cuja fumaça toxica paralisou a cidade, interrompendo as aulas e o trânsito, a demonstrar a necessidade de interdição do aterro. Assim, ressalta o descaso do Município em todos esses anos para como a situação do lixão e a destinação final dos resíduos locais. Observo que, na verdade, embora pretenda a suspensão do ato do INEA, em nenhum momento aponta o Município qualquer irregularidade ou ilegalidade no processo administrativo (E07/002.6483/2014), no bojo do qual foi expedido o Auto de Constatação COFISCON/6414. Desta forma, defiro a efeito suspensivo pleiteado. Informe ao Juízo de primeiro grau”, decidiu a desembargadora Inês de Trindade Chaves Mello em 26 de junho de 2023, determinando a extinção do lixão que o prefeito reabriu na noite desta quarta-feira, 4, ao empurrar o lixo vazado e não transbordado para vazar o lixo que coletou ao longo do dia, continuando o vazamento do lixo ao longo desta quinta-feira, 5.
SEM LIMINAR
A contratação da União Recicláveis Rio Novo Ltda ocorreu no dia 19 de julho, sendo iniciado o serviço no dia seguinte, 20, e o primeiro pagamento ocorreu somente em 25 de outubro, três meses e uma semana depois, ainda assim, de forma parcial. Ou seja, a empresa que faz o carregamento e transbordo prestou os serviços de forma reconhecidamente eficiente desde o dia seguinte à contratação emergencial efetivada, sem interrupções, resolvendo o problema da Prefeitura naquele mês, porque o Tribunal de Justiça havia fechado o lixão clandestino depois que ele pegou fogo.
Contrariando a Nota da Prefeitura, que afirmara a possibilidade de atrasar o pagamento por até dois meses, a empresa informou, também em Nota, que buscou sempre conciliar-se junto ao Município para que os pagamentos ocorressem no prazo contratualmente estipulado, de 30 dias da emissão dos documentos de faturamento – nota fiscal e demais comprobatórios da prestação dos serviços, o que lhe permitiria cumprir com as obrigações que assumiu no tempo e modo que contratou. “Mas os atrasos e pagamentos fracionados dos documentos de fatura emitidos persistiram, o que se sabe compromete gradualmente a capacidade da empresa em arcar com os custos/despesas/obrigações que assumiu para a execução do objeto contratado (carregamento, transporte rodoviário, tratamento e disposição final ambientalmente adequada em aterro sanitário licenciado, dos resíduos sólidos urbanos gerados em Teresópolis/RJ)”.