Marcus Wagner
Além do sofrimento causado pela Endometriose, pacientes de Teresópolis estão enfrentando ainda a incerteza de conseguir o tratamento para a doença pelo SUS por conta de uma demorada fila de espera. De acordo com as reclamações, algumas já aguardam há mais de um ano a convocação para realizarem a cirurgia sem sequer ter uma previsão de quando isso irá acontecer. Nossa reportagem procurou a Secretaria Municipal de Saúde para obter os esclarecimentos sobre esta situação e a promessa é de uma solução já nos primeiros meses. Atualmente, a lista de espera conta com 16 pacientes que sentem o quadro da doença se agravar a cada dia.
De acordo com o secretário Antonio Henrique, a demora excessiva e dolorosa para as pacientes acontece porque as cirurgias estavam na fila da rede estadual, o que deve mudar em 2020. Outro grande entrave para o tratamento cirúrgico em Teresópolis é que existe apenas uma equipe atuando nessa especialidade, atendendo também a outros municípios.
Antonio afirmou que o planejamento para o próximo ano conta com uma verba extra que irá financiar cirurgias: “Para esclarecer à população, a Endometriose é um tipo de patologia que não está na tabela do Ministério da Saúde, daí a dificuldade de conseguir fazer essa cirurgia nos municípios. Anteriormente, essas pacientes eram encaminhadas para a Secretaria Estadual de Saúde que fazia a cirurgia pelo estado. Hoje são 16 pacientes esperando em Teresópolis. Vamos o mais rápido possível baixar essa fila, realizar essas cirurgias. O governo do estado vai emitir cerca de R$ 70 mil por mês só para cirurgias no Hospital São José. Vou me reunir com o prefeito para fechar o Plano Operativo Anual (POA) dos três hospitais e em uma das metas do São José está a cirurgia de Endometriose”.
Procedimento de chamada
O secretário destacou que não existe uma ordem pré-definida de chamada, porém garantiu que será montado o cronograma mais adequado para que todas tenham o tratamento cirúrgico o mais rápido possível. “A prioridade vai ser de acordo com a patologia e a indicação clínica, não posso falar quem vai ser primeiro. Todas serão chamadas para avaliação com a equipe especializada que vai determinar qual complexidade da cirurgia, qual data poderá ser feita, uma indicação médica eu vamos aguardar com a evolução medicadas equipes”, disse Antônio.
Existe ainda outro fator que pode fazer com que as pacientes demorem mais a estarem aptas para o procedimento que é a migração da rede particular para a pública, em que o processo precisa recomeçar: “Já tivemos casos de pacientes que não tiveram nenhuma entrada pela rede pública de saúde, o SUS. Aconselhamos ela a voltar, fazer o cartão SUS, se cadastrar porque quando o paciente faz pelo particular, a gente desconhece essa patologia. Quando faz o cadastro, a gente sabe qual é a patologia, onde e como ela está se tratando e isso é melhor para a gente intervir em cada caso”.
Juiz de fora é exemplo de excelência
Se em Teresópolis as pacientes sofrem por meses na espera de uma solução, a cidade mineira de Juiz de Fora é uma referência nacional no atendimento, tratamento e na recorrência de intervenções cirúrgicas em mulheres que são acometidas pela Endometriose. Nossa reportagem percorreu quase 140 quilômetros para conhecer esse trabalho e entender como se deu essa diferenciação. Lá fomos recebidos por um dos maiores nomes do país neste tipo de especialidade, o médico Josélio Vitoi Rosa, que no Hospital Monte Sinai comanda uma equipe multiespecialidade que realiza diversas cirurgias do tipo com grande frequência. Dr. Josélio explicou o que é a doença, como ela está inserida no nosso dia-a-dia e porque Juiz de Fora se destaca nacionalmente hoje.
“É preciso entender em primeiro lugar, que mesmo com muitas pesquisas e inovações tecnológicas na área médica, ainda assim, pouco se sabe sobre a Endometriose. Ela acontece quando o endométrio, ou seja, o tecido que reveste a parede interna do útero, é eliminado durante a menstruação e passa a crescer fora da cavidade uterina, nos ovários, trompas, intestino, bexiga e até em outros espaços do organismo. Assim, esse endométrio que, mensalmente, acumula-se dentro do abdômen provoca um processo inflamatório na pelve, podendo levar à aderência entre os órgãos dessa região. Mas seu principal sintoma é a dor, muitas vezes insuportável, principalmente pelo enrijecimento dos tecidos”, explica o médico.
Diagnóstico e a possibilidade de gravidez
Desconfiar da doença precocemente é o maior desafio, pois a endometriose pode ser assintomática e só descoberta quando a mulher não consegue engravidar. Mas ainda assim, entre as mulheres diagnosticadas surge o grande medo da infertilidade em virtude do problema. Segundo Dr. Josélio, nem sempre essa é uma realidade, na verdade, na grande maioria das vezes não. “Não é o diagnóstico da Endometriose que vai representar automaticamente a impossibilidade de uma gravidez para esta mulher que se submeterá possivelmente a uma cirurgia ou tratamento. Na verdade, um grande percentual das mulheres que fazem a cirurgia de Endometriose acaba engravidado naturalmente, apenas algumas poucas terão que recorrer a fertilização in vitro, mas é importante dizer que o tratamento medicamentoso não é o mais indicado quando da possibilidade de nova gravidez futura, e sim o cirúrgico”, explica e acrescenta o médico.
O médico lembra que são quatro classificações para a doença, sendo as mais graves as de nível 3 e 4, que atingem diversos órgãos da pelve e exigem uma equipe multiespecialidade para a realização dos procedimentos. As intervenções podem durar de cinco a seis horas e são feitas, em 99% dos casos, por vídeolaparoscopia. Todas exigem instrumental especializado e exames diagnósticos anteriores que ajudam a definir o alcance das lesões e os especialistas a serem envolvidos na cirurgia. O procedimento cirúrgico de endometriose é de alto custo e numa condição particular pode chegar a custar até sessenta mil reais.
Dificuldades e parcerias
O alto custo e a ausência de especialistas na área são dois fatores apontados por Dr. Josélio como sendo preponderantes nesta quase “inacessibilidade” dos pacientes SUS aos procedimentos e terapias. Segundo o médico, algumas parcerias realizadas com institutos e a grande quantidade de profissionais formados com essa atuação levaram a cidade de Juiz de Fora e região se tornarem referência no que diz respeito a Endometriose.
“Considero que o grande problema do acesso à cirurgia para endometriose está no fato de o ideal para a realização deste procedimento estar nas intervenções via vídeolaparoscopia. Isso dificulta muito, uma vez que poucos ginecologistas fazem procedimentos por vídeo, e entre os que fazem, um menor número ainda tem as condições e habilidades necessárias para a intervenção. Além de conhecer a anatomia profundamente, é preciso saber sobre vasos sanguíneos, inervações e a iniciação neste tipo de especialização exige pelo menos cinco anos de experiência anterior em vídeolaparoscopia. Mas esses procedimentos também infelizmente são muito caros, o que evidentemente deixa muito difícil a disponibilização via SUS”, lamenta.