Desejando vincular e perpetuar a memória de Eliseu d’Angelo Visconti com a história de Teresópolis, onde o artista viveu cerca de um quarto de século, servindo-se das nossas montanhas como palco para a sua arte, familiares do pintor ofereceram à Prefeitura, no ano de 1963, uma de suas mais significativas obras, chamada “Saudação à Bandeira”.
Serviu de cenário para a pintura, em que as figuras centrais são a esposa Ivone e os dois filhos do casal junto ao presidente da República Getúlio Vargas, a escola Hygino da Silveira, onde todas as manhãs, antes de dar início às aulas, as crianças entoavam com vigor patriótico o Hino Nacional enquanto era içado o pavilhão, encantando o artista que morava em frente numa elegante residência afastada da avenida.
“Visconti não pinta a saudação à bandeira como o cumprimento de um ritual escolar diário, mas como festa cívica repleta de entusiasmo. A composição confere grandiosidade à arquitetura neoclássica da escola, que toma ares majestosos de monumento. O uso que Visconti faz do pontilhismo nesta pintura é muito adequado ao propósito da obra: apresentar uma alegoria sobre a importância da educação cívica. Ao transformar uma ação cotidiana em festa, o artista a desloca para o território mítico e atemporal. Para tanto, usa recursos pictóricos a fim de construir uma atmosfera irreal. Por meio das pequenas manchas de cor que o pontilhismo possibilita, cria a névoa lilás no último plano, ligeiramente amarelada no plano médio e em tons mais aquecidos no primeiro plano. Outro ponto a se notar é o modo como constrói com manchas cromáticas a bandeira, usando as complementares para criar zonas de sombra, e também como dirige o olhar do observador com pequenas manchas de verde e vermelho distribuídas pelo plano médio da pintura, inclusive no vestido de Yvonne”, destaca M. Izabel Branco Ribeiro, ao inserir a pintura na Galeria da Coleção Grande Pintores Brasileiros.
Exposta em 1940, no 46º Salão Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, a pintura em óleo sobre tela com 192x240cm é datada do mesmo ano e sumiu da Prefeitura, onde nem um registro fotográfico ficou guardado dela, reaparecendo no acervo da Pinacoteka do Estado de São Paulo.
O desaparecimento da obra de arte não foi resultado de um furto, como quase sempre ocorre, mas fruto do desinteresse da municipalidade. É que, nos anos 1970, atendendo queixas dos familiares do artista quanto ao mau estado de conservação do bem, o prefeito de então teria entendido por bem devolver o quadro aos cuidados da família do pintor, alegando falta de recursos para o restauro e manutenção.
Retirado o quadro da Prefeitura, onde a pintura foi ignorada por vários anos apesar de exposta na parede da secretaria de Administração, anos depois, em 1983, sem que alguém reclamasse a falta do bem, a pintura foi vendida à Francisca Nivalda de Oliveira Silva, acompanhada de uma declaração de que a doação à municipalidade não teria se concretizado por instrumento legal e por desinteresse mesmo da mesma prefeitura que nunca acusou o recebimento do quadro por um termo de doação ou escritura. Depois, o valioso quadro da nossa memória municipal foi doado à Pinacoteca do Estado de São Paulo, in memoriam de Antônio Luiz de Almeida Brennand Neto, em 20 de dezembro de 2002, permanecendo por um período em exposição, e depois guardada na reserva técnica do museu.
O TERMO DE DOAÇÃO
“Os infra assinados, na qualidade de filhos do finado artista pintor, Eliseu d’Angelo Visconti, desejando vincular e perpetuar sua memória à vida e história da Cidade que foi pelo mesmo tão extremosamente amada e que, durante cerca de um quartel de século, serviu de palco e de musa inspiradora à manifestação de uma das mais destacadas fases de sua fecunda vida artística, vêm à presença de V. Ex. para, por seu intermédio, oferecer ao Povo e à Cidade de Teresópolis, a tela a óleo intitulada ‘Saudação à Bandeira’”
“Os infra assinados, na qualidade de filhos do finado artista pintor, Eliseu d’Angelo Visconti, desejando vincular e perpetuar sua memória à vida e história da Cidade que foi pelo mesmo tão extremosamente amada e que, durante cerca de um quartel de século, serviu de palco e de musa inspiradora à manifestação de uma das mais destacadas fases de sua fecunda vida artística, vêm à presença de V. Ex. para, por seu intermédio, oferecer ao Povo e à Cidade de Teresópolis, a tela a óleo intitulada ‘Saudação à Bandeira’”
Carta ao prefeito Flávio Bortoluzzi, em 1963
Com informações de:
Frederico BARATA. “Eliseu Visconti e seu tempo” Rio de Janeiro: Zelio Valverde, 1944.
Maria Izabel Branco RIBEIRO. “Eliseu Visconti”. Folha de S. Paulo, 2013.
Mirian N. SERAPHIM, “Eros adolescente: ‘No verão’ de Eliseu Visconti”. Campinas: Autores Associados, 2008.
Tobias Stourdzé VISCONTI. (Org.). “Eliseu Visconti: A arte em movimento”. Rio de Janeiro: Hólos, 2012.