O dia 17 de julho de 1949 nunca vai sair da memória de Lilia Montanha. Nessa data ela era uma jovem menina, então com 15 anos, e se tornou a primeira teresopolitana a pisar no cume da montanha mais famosa do país, o Dedo de Deus. Acompanhada de amigos e familiares, venceu as dificuldades da caminhada íngreme, as apertadas fendas, a exposição aos abismos e a falta de recursos técnicos comuns à época para realizar um sonho que acabaria entrando para a história do município. Aos 84 anos, ela lembra exatamente cada detalhe da escalada, cada momento de frio na barriga ou expectativa de chegar ao lance seguinte. “Eu fecho os olhos e escalo tudinho novamente, da base até o topo do montanha. Não esqueci absolutamente nada, do começo ao fim, da vista lá de cima, das árvores, de tudo que vi pelo caminho”, relata a aposentada 69 anos após a grande aventura.
Vale lembrar que a história da conquista do Dedo de Deus e do início da prática desse esporte no país estão intimamente ligadas com Teresópolis. Em 08 de abril de 1912, um grupo de moradores do município foi o primeiro a pisar naquele cume, a 1.692m de altitude. José Teixeira Guimarães, Raul Carneiro e os irmãos Américo, Acácio e Alexandre de Oliveira provaram que os brasileiros tinham condições de ter sucesso nas escaladas – apesar da falta de técnica e equipamentos. Eles se aventuraram montanha acima motivados pela provocação de um grupo de alemães, que havia sido vencido pelo Dedo e dito “que se eles não conseguiram, ninguém conseguiria”. A partir daí, a escalada deslanchou no Brasil.
Apenas 21 anos após a conquista uma mulher chegou ao topo do Dedo de Deus. A carioca Luiza Caracciolo realizou o feito aos 19 anos, em 1933. Em 1949, foi a vez de uma teresopolitana escrever seu nome na história do montanhismo local. Escondida da mãe, Lilia participou da aventura ao lado de Geny Cardoso, Ilka Montanha e os meninos Renato Nogueira Marques, Carlos Simão Arbex, Kival Simão Arbex, Haroldo Falcão, Theodoro Silva, Abdux Arbex, Edmundo Montanha, Julio Américo de Oliveira e Adilson Falcão da Graça. Eles foram levados pelos montanhistas Paim e Miguel Inácio Jorge, um dos conquistadores da Verruga do Frade e conhecido como “Senhor da Torre” por ter sido o responsável pela manutenção na Matriz de Santa Teresa por várias décadas. “Minha mãe achava que era perigoso demais, mas eu queria e fui incentivada pelo meu irmão, Edmundo. Não queria mais ficar fazendo só caminhada, queria escalar o Dedo de Deus e das três meninas era a mais nova e fui a primeira menina a pisar naquele cume maravilhoso”, conta ela, que também já esteve em outras montanhas como Verruga do Frade e Pedra do Sino.
Montanha no nome e coração
Em outubro de 1966, um acidente de carro na estrada Rio-Teresópolis tirou Lilia das montanhas. Paralítica por um longo tempo, recuperou os movimentos e, mesmo de bengala, ela retomou suas caminhadas pelo centro, prova de que o exercício, além de fazer bem para a mente, é essencial para o corpo. A tristeza, somente, por não poder mais se aventurar na Serra dos Órgãos. Ainda assim, mantém sua paixão pelas formações rochosas da região. Aliás, montanha é seu sobrenome de verdade, não um apelido por conta do feito que se tornou histórico. Lilia do Nascimento Montanha. Ou seja, uma mulher que realmente nasceu para esse esporte. Em entrevista concedida ao jornal O DIÁRIO e DIÁRIO TV, Lilia deixou uma mensagem de incentivo aos jovens. “Que vão, que conheçam, que tenham histórias para contar no futuro… É maravilhoso”, enfatiza a primeira dama do montanhismo teresopolitano.