Wanderley Peres
Desde bastante tempo venho colecionando exemplares de jornais que circularam em Teresópolis, mantendo em acervo encadernado todas as edições dos jornais Gazeta de Teresópolis e do DIÁRIO, além de alguns cadernos do Teresópolis Jornal. Do Diário, estão guardadas todas as edições, a partir de 1988; do “O Therezopolis” e “Teresópolis Jornal”, que são dois títulos mas um só jornal, tenho alguns anos e, da “Gazeta de Teresópolis”, o acervo é completo, com o segundo e terceiro períodos do jornal devidamente encadernados: dos anos 1936 a 1954, presente que Gilda Lopes Leite recebeu da família do antigo redator do jornal, Omar Magalhães, e me deu para que eu guardasse; e do período entre 1970 a 2009, que a jornalista Nida Rego me presenteou junto com o seu valioso acervo fotográfico, inclusive os negativos e as imagens digitais, doações que me agradaram muito e agradeço a generosidade das duas amigas de tempo distinto na história da Gazeta, onde me iniciei na imprensa teresopolitana, em fevereiro de 1977.
Além dos jornais que contam a história de Teresópolis ao longo dos quase 120 anos de existência da imprensa local, guardo também encadernações de jornais com a duração efêmera, alguns títulos com todas as edições, vários outros falhando datas. E, guardo, ainda, as edições ano 1 número 1 de vários títulos que vieram a luz na cidade, que ficam em pastas onde estão livres da exposição ao tempo e das traças.
São mais de 50 títulos de jornais importantes, e um sem número de jornais temáticos, de sindicatos, clubes, escolas, igrejas, itens museais que acabam sendo interessantes para a memória também, garimpo que vou fazendo e me surpreendendo com o que vou encontrando. Recentemente, depois de enriquecer o acervo com o que guardou o colecionador Adérito Varejão e a amiga Helena Turl, ganhei dois exemplares raríssimos, e em perfeitíssimo estado. Estavam guardados pelo médico Antonio Sumavielle, e vieram junto com as suas coisas para o Pró-Memória Teresópolis, presente do casal Iza e José Pereira, que ganharam do amigo deles todo o acervo do Mamute, passando os bens à minha guarda.
Uma edição é exemplar do jornal “O Fluminense” de 1878, que pouco valor tem, para mim. Já o outro exemplar é um "Theresopolis", com "th" e "s", editado em 1911, jornal que sabia da existência mas nunca imaginei ver um, tão raro que era mesmo no tempo em que circulava.
É o “jornalzinho que se permitiu o direito de chamar a si o nome de nossa terra e que se edita em Niteroy, sendo lido em Teresópolis por meia dúzia de pessoas”, como escreveu Osiris Rahal em seu livro “Reminiscências de Teresópolis”, onde , segundo artigo publicado, o desafeto “Theresopolitano” diz que viu-se atrapalhado por conseguir um numerozinho, “o que só conseguimos depois de correr Séca e Méca de Olivaes de Santarém”. Segundo o “Theresopolitano”, o “Theresopolis” era um jornal “vermelho de cólera, roxo de raiva, escabujando bílis, vomitando peçonhas e cuspindo pus”, além de hediondo e asqueroso”.
Depois do que disse o “Theresopolitano”, não precisaria dizer mais nada sobre esse “Theresopolis”, não fosse ele propriedade de Lafayete Borges, ligado à câmara municipal, e uma das três vítimas fatais do atentado de 1912, quando feriram-se 8 pessoas num tiroteio havido na sessão eleitoral, crime que envolveu os poderosos da cidade de então, entre eles, o diretor do “Theresopolitano”, Horácio Rocha, um dos acusados pelo atentado.
Guardado no fundo Sumavielle, do Pró-Memória Teresópolis, esse "Theresopolis" foi o segundo jornal criado em nossa cidade, em 1911, quando o "Theresopolitano", de 1902, estava fora de circulação, depois da morte do seu proprietário, Eduardo Meirelles Sobrinho, em 1909, voltando a circular, somente, com a morte do dono do "Theresopolis", em março de 1912, existindo, ainda por algum tempo, até meados daquela década, quando já circulava a “Gazeta de Teresópolis”, criada em 1913 pelos novos mandatários da câmara municipal, surgindo ainda nos anos 1910 "O Paquequer", de Sebastião Teixeira e o "Correio Popular", de seu desafeto Antônio Santiago, coexistindo em birras constantes entre 1918 e 1922, sendo substituídos pelo “O Therezopolis”, de Olegário Bernardes e Nilo Tavares, em 1923.
Curiosamente, os donos do "Theresopolis" e do "Theresopolitano” foram vítimas de atentados, os dois provocados pelas paixões da política. O primeiro, morreu com um tiro, nos “sucessos de 1912”, e o segundo por um ataque cardíaco. Um dono de jornal não queria a criação da prefeitura, porque era um dos que se agradava da cidade sob o controle da Câmara que controlava, disputa ideológica que o levou ao conflito. O outro, morreu três anos antes ao ver-se suspeito de não ser fiel aos seus princípios, trágica morte provocada pelo jogo sujo da política e uma suposta fake-news que correu pela cidade à época.
Muito interessante a história da imprensa em Teresópolis. No mínimo uns 100 títulos de jornais já tivemos e todos eles além de terem contado muitas histórias interessantes têm também as suas histórias, quase sempre apaixonantes. Dá bem um livro.
Fake-News, mais de cem anos atrás
Relato pouco conhecido da história de Teresópolis, não tendo sobrevivido na memória das pessoas ao final século passado, a morte do ilustre proprietário do “Theresopolitano” é caso interessante.
Quem instalou o telégrafo em Teresópolis, no ano de 1903, o engenheiro Eduardo Meirelles Sobrinho era afilhado político do presidente de Estado Alfredo Backer (1906-1910), governador que era desafeto do então presidente da República, Nilo Peçanha, ex- presidente de Estado, entre 1903 e 1906. Por maldade, e provocado pelos nilistas que apoiavam a candidatura de Hermes da Fonseca naquele ano, o presidente da República transferiu para o estado do Piauí o teresopolitano que era o “chefe da estação”. Adversários de Backer e Meirelles queriam o cobiçado cargo e ofereceram ao presidente, como troca pela transferência do adversário, a criação de um partido político em nossa cidade para apoiar Hermes da Fonseca.
Ao ver-se na aflitiva condição, Eduardo Meirelles procurou Nilo Peçanha, pedindo ao presidente da República a reconsideração do ato, alegando os seus serviços essenciais, a sua longa permanência em Teresópolis, e os seus haveres, e as propriedades aqui, a impossibilidade, enfim, de transferir-se para lugar tão distante com a família, sendo imposto a ele que fundasse um partido em apoio à candidatura militar de Hermes da Fonseca em Teresópolis, pedido que não cedeu.
“Quem conheceu esse digno cavalheiro imagina as torturas por que passou o seu espírito; a dificuldade em que se encontrou para fugir aos seus antigos compromissos políticos e bandear-se para os adversários, indo combater o governo do Estado, que sempre o apoiou. Ao voltar a Teresópolis, não teve coragem de falar aos seus amigos sobre o assunto, relutando no que devia fazer, decidindo escrever um abaixo assinado em que era feita uma representação ao governo federal para a sua permanência na cidade, subscrevendo o documento, prontamente, todos os seus amigos, e dentro em pouco grande número de assinaturas de pessoas qualificadas enchiam o papel”, relatou o jornal A Capital. Ainda segundo a imprensa, depois de colhidas as assinaturas, o abaixo assinado teve alterado o cabeçalho, alguém inserindo os dizeres … “e para constituir-se um partido, que apoiará a candidatura do marechal”.
Sabido por alguém que aos dizeres anteriores do abaixo assinado se haviam acrescentado outros dizeres, foi convocada uma reunião para o edifício da Câmara Municipal afim de tomar-se conhecimento desse fato, já comentado nos bastidores da política. “Nessa reunião, presente o dr. Meirelles Sobrinho, os signatários da representação declararam francamente que tinham dado as suas assinaturas para pedir ao governo federal a permanência do chefe da estação telegráfica mas não para a formação de partido algum. Colhido assim por aquele protesto, numa reunião solene em que estavam as pessoas mais gradas do lugar, o dr. Meirelles Sobrinho, um homem honrado, teve tal emoção, que caiu fulminado por uma síncope”, relatou o jornal A Capital, em 28 de maio de 2010.