As cooperativas de trabalho surgiram como uma alternativa colaborativa para atender às necessidades básicas de trabalhadores com poucos recursos. A proposta visava eliminar intermediários na atividade econômica, permitindo que os próprios trabalhadores compartilhassem a propriedade dos meios de produção. Com a promulgação da Lei nº 12.690/2012, o regime jurídico dessas entidades foi sistematizado, trazendo orientações claras para seu funcionamento.
Conforme o art. 2º da referida legislação, considera-se cooperativa de trabalho a sociedade formada por trabalhadores que exercem atividades laborais ou profissionais com o objetivo de melhorar a qualificação, a renda e as condições gerais de trabalho, promovendo autonomia, autogestão e benefícios compartilhados. Esse conceito reforça o caráter participativo e colaborativo das cooperativas, diferenciando-as de outras formas de organização econômica.
O princípio do benefício comum é um dos alicerces do cooperativismo, assegurando que os resultados obtidos sejam distribuídos entre os associados. Esse princípio reflete-se na gestão democrática, que busca a equidade na divisão dos resultados e na participação conjunta dos membros nas decisões.
Outro ponto central é a autonomia das cooperativas, prevista no art. 2º, §1º, da Lei nº 12.690/2012. A autonomia é essencial para evitar interferências externas que possam configurar subordinação, elemento típico de relações empregatícias. As deliberações internas devem ser feitas de maneira democrática, garantindo a autogestão.
A autogestão, enquanto modelo organizacional, atribui aos associados a responsabilidade pela administração da cooperativa. Essa característica fortalece o vínculo associativo, também conhecido como affectio societatis, que se baseia na adesão voluntária e na participação efetiva dos membros.
Embora o modelo cooperativo tenha sido criado para promover a inclusão econômica e social, é frequentemente desvirtuado para ocultar relações de emprego, em prejuízo dos trabalhadores. Esse desvio ocorre por meio de falsas cooperativas, usadas para intermediar mão de obra e evitar encargos trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A fraude se configura quando os elementos da relação de emprego, como subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade, estão presentes, mas disfarçados pela estrutura formal de uma cooperativa. Nessas situações, a cooperativa torna-se um instrumento de redução de custos para as empresas, à custa dos direitos trabalhistas.
O art. 5º da Lei nº 12.690/2012 veda expressamente a utilização de cooperativas como intermediadoras de mão de obra, reafirmando que a autonomia e a autogestão são indispensáveis à sua legitimidade. Complementarmente, o art. 9º da CLT estabelece que são nulos os atos destinados a fraudar a aplicação da legislação trabalhista.
O Poder Judiciário tem desempenhado papel crucial no enfrentamento de fraudes envolvendo falsas cooperativas. A jurisprudência reafirma que, na ausência de affectio societatis e na presença de subordinação, o vínculo empregatício deve ser reconhecido, responsabilizando o tomador de serviços ou a própria cooperativa.
Decisões marcantes do Tribunal Superior do Trabalho (TST) destacam que contratações fraudulentas violam direitos fundamentais dos trabalhadores e o princípio da dignidade da pessoa humana. Além disso, práticas abusivas comprometem a legitimidade do sistema cooperativista, contrariando sua finalidade social de promoção do bem-estar e desenvolvimento de seus membros.
Se a cooperativa atua exclusivamente como intermediadora de mão de obra, os elementos característicos da relação de emprego, como subordinação e dependência, configuram vínculo trabalhista, conforme o art. 3º da CLT.
A Lei nº 12.690/2012 assegura aos cooperados direitos sociais em alinhamento com o art. 7º da Constituição Federal, reforçando a necessidade de as cooperativas respeitarem padrões mínimos de proteção ao trabalhador, em conformidade com os princípios constitucionais da dignidade humana e valorização do trabalho.
Em suma, as cooperativas de trabalho desempenham um papel fundamental na promoção da autonomia e da autogestão dos trabalhadores, desde que operem em conformidade com os parâmetros legais. Contudo, é essencial combater práticas fraudulentas que desvirtuem o modelo cooperativo para mascarar relações de emprego. O rigor da fiscalização e a atuação efetiva do Poder Judiciário são indispensáveis para proteger os direitos dos trabalhadores e preservar a credibilidade do sistema cooperativista.
Helena Gonzaga Daflon Gomes, inscrita na OAB/RJ 240.843, advogada formada pelo Centro Universitário Serra dos Órgãos – UNIFESO, pós graduanda em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário pela PUC MG. Atuante no âmbito Trabalhista, com especialização em Contratos e Negociações Preliminares pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Departamento Pessoal pela ESA/SP