Há um constante embate entre o individualismo e o serviço. Tal como qualquer “ismo” prevalece um sistema com suas regras para conduzir doutrinariamente um indivíduo, ou seja, qualquer individualista apenas busca se perceber no mundo e vive prioritariamente em um sistema onde a roda da acumulação, êxito e poder gira ao seu favor. Essa tal roda, gira entre alguns fatores, impelida pelo darwinismo social onde quem está mais apto ao mercado sobrevive e os menos aptos sucumbem diante dos nossos olhos com total menosprezo.
O darwinismo social surgiu fundamentado nas propostas biológicas do inglês Charles Darwin. Alguns pensadores sociais transportaram as ideias darwinistas de evolução e adaptação aplicadas ao campo biológico para trazer assim uma compreensão das civilizações e demais práticas sociais. Essa cosmovisão social está atrelada a justificativa das grandes potências capitalistas, isto é, a assertiva para a promoção de um neocolonialismo nos territórios afro-asiáticos, e porque não dizer, veladamente ou nem tanto assim, nos ares latino-americano. Esse “tiro certeiro” não foi tão certeiro assim, pois fica clara a implementação descarada de uma superioridade de determinadas nações e sua insistência de “enfiar goela abaixo” o desejo do seu estilo de vida próprio (american way). Os darwinistas sociais foram infelizes, pois interpretaram os aspectos sociais por um viés que não é justificável nem pelo darwinismo biológico.
De fato, o darwinismo social criou métodos de compreensão da cultura impregnados de equívocos e preconceitos. Na verdade, ao falar de evolução, Darwin não trabalhava com uma teoria vinculada ao choque binário entre superioridade e inferioridade. Sendo uma experiência dinâmica, a evolução darwiniana acreditava que as características que determinavam a “superioridade” de uma espécie poderiam não ter serventia alguma em outros ambientes prováveis.
A compreensão das nações “superiores” em relação as “inferiores” é caracteristicamente narcisista. Olham de cima para baixo, como os sem cultura ou os de subcultura, enquanto aquelas são o suprassumo da inteligência e da evolução. Onde todos os caminhos possíveis já foram perseguidos pelos superiores e os inferiores devem ser vistos como coitados, bárbaros ou jurássicos no entendimento do todo. O dinamismo étnico desvincularia qualquer ensejo de padrão. O que serve para uns não necessariamente atende a todos!
As pessoas seguem os padrões não com aquele coitadismo apenas de serem aceitos pela sociedade, mas muito mais pelo desejo antropofágico de querer ser o outro. Vamos melhorar essa compreensão? O desejo do escravo não era deixar de ser escravo para viver sua liberdade, ter sua própria terra, cultivá-la, buscar relacionamentos longe das obrigatoriedades, ir e vir quando e onde quisesse, espreguiçar-se e alongar-se ao seu bel prazer, contemplar a luz do dia e contar as estrelas sem a repressão do olhar do seu déspota, nada disso! Tudo isso é poético, mas não prático, pois a maioria deles queriam de fato era se torna um dia senhor e, portanto, poder escravizar os outros. É duro perceber que em nossas relações o que traz contento não é o que traz alegria a todos, mas sim a dor do outro.
Servir é o ato de compreensão dos limites. Quantos são animais ferozes em relação aos limites alheios, mas são belas e inofensivas ovelhinhas em relação as suas próprias limitações. Reclamam quando o mundo é incompassivo com eles, mas são incompassivos as limitações do outro. O Apóstolo Paulo quando fala da carne sacrificada a ídolos alerta para que não nos achemos a medida de todas as coisas. Jesus dirá: Com à medida que vocês medirem, vocês serão medidos também.
Não são as imposições dos padrões de sucesso e de status que trará vida, já que a vida se faz quando encontra as diversidade da experiência alheia. Como numa grande Pangeia, retornamos à junção dos continentes que um dia decidiram se ilhar. Vale aqui lembrar o que o filósofo colombiano Bernardo Toro nos alerta “o cuidado não é uma opção: aprendemos a cuidar ou perecemos”. Segundo ele, esse “saber cuidar de si e do outro” é o cuidado fundamental. A partir dessa consciência, os que ficarem para trás não serão considerados matéria de análise para o carbono 14 no futuro, mas seguiremos juntos para o sagrado sonho chamado Reino de Deus. Um reino que assimila a multiplicidade como riqueza daquilo que nos promove a humanidade.