André Oliveira
Quem nunca recebeu daquela tia desatenta ou da avó que não conta com o crescimento da estatura dos netos aquele presente que não serviu. Não faltam ainda casos onde a cor e o modelo acabam não agradando, apesar do carinho de quem presenteou. Nessas horas muita gente conta com a boa vontade de comerciantes para conseguir a troca do produto. Enquanto clientes vêm essa ação como uma adequação do presente ao útil e agradável, comerciantes enxergam a possibilidade de novos negócios. É bom que se diga: se o produto não tem defeito, a loja não tem qualquer obrigação legal de fazer a troca. Porém, entra em campo o bom senso e, salvo raras e desnecessárias exceções, a troca acontece para felicidade de todos.
Comerciário e gerente da loja Varejão, Wellington Pfister confirma a tese da possibilidade de fazer da troca um novo negócio. “Hoje em dia a troca faz parte do processo. Pra gente é um pós venda, uma possibilidade de conquistar o cliente e efetivar essa parceria com a loja”, confirma. Segundo o comerciário, o grupo Vogue, da qual sua loja faz parte, já tem uma política para esse procedimento. “Quem comprou a partir de 1º de dezembro, embora nosso prazo normalmente seja de dez dias, vamos estender esse período até 15 de janeiro. Basta vir às nossas lojas e procurar nossos vendedores para isso”, revela. “Tudo faz parte da nossa estratégia de vendas, conquistar o novo cliente, oferecer produtos que vão completar aquela venda. Todos nossos amigos já conhecem nossa forma de trabalhar e por isso são nossos fregueses”, comemora.
Vendas cresceram
Com isso, o momento é de aproveitar o bom humor dos empresários. Até por que as vendas neste período do Natal cresceram. Com isso, o número de trocas e reclamações também tende a aumentar. Apenas até o dia 20 de dezembro, foram registradas mais de 11.700 reclamações sobre problemas com compras feitas para o Natal no portal Reclame Aqui. Para que possa ter direitos garantidos, a população deve estar atenta às regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor (CDC), conjunto de normas que tratam da proteção do consumidor.
Se houver defeito, o Código de Defesa do Consumidor garante o direito de troca. O artigo 18 diz que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”.
Produto considerado essencial, como geladeira, deve ser restituído imediatamente. Quando o problema for aparente, isto é, for facilmente visível, o prazo do direito de reclamar é de 30 dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis, como alimentos, e de 90 dias, no caso de serviço ou produtos duráveis, a exemplo de eletrodomésticos. Se o defeito não for aparente, esses prazos começam a contar quando o problema for diagnosticado. Essas regras também estão no artigo 18 do CDC.
Sem obrigação de trocar
Pela lei, as lojas não têm a obrigação de trocar todos os tipos de produto. Por exemplo, roupas que não agradaram ou brinquedos repetidos só podem retornar às prateleiras se a loja oferecer essa condição e estiver dentro do prazo estipulado por ela. Nesses casos, é importante guardar embalagem, etiquetas e nota fiscal, a fim de comprovar a data da compra e também que o produto não foi usado, além de outros critérios que o próprio estabelecimento tenha inserido em sua política de trocas.
O advogado Paulo Roque Khouri, especialista em direito do consumidor, explica que a troca em decorrência de desagrado, sem que haja defeito, embora não esteja regulamentada, já faz parte da cultura do comércio brasileiro, que busca manter a fidelidade dos clientes. “O comerciante tem uma ideia de que não pode recusar a troca”, resume, acrescentando que, por isso, é comum que a informação sobre impossibilidade de trocas seja destacada no estabelecimento comercial. Outro ponto que ele destaca é o fato de a lei brasileira não admitir a troca por dinheiro nos casos de arrependimento de compra em lojas físicas.
As lojas, em suas próprias políticas de troca, acabam criando opções. Em um shopping na região central de Brasília, Alexandre Trindade, aguardava na fila, formada por cerca de sete pessoas, sua vez de trocar o presente. É que a mãe errou e comprou uma blusa um pouco maior do que o modelo dele. Questionado sobre os direitos do consumidor, Trindade logo informou que a blusa “está com a etiqueta”. A vendedora da loja de departamentos informou que ela possibilita a troca por um vale de valor equivalente, o qual pode ser usado em qualquer outra unidade da rede.
Em geral, o prazo para a reparação é de 30 dias e o fornecedor também tem um mês para consertar a falha. Se o problema não for resolvido nesse período nem tiver sido objeto de negociação, o consumidor tem o direito escolher entre a substituição do produto por outro em perfeitas condições de uso; a restituição imediata da quantia paga, inclusive com os valores atualizados, ou o abatimento proporcional do preço. No caso de fornecimento de produtos in natura, o consumidor pode cobrar providências do fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor.
Compras online
Ao fazer uma compra fora do estabelecimento comercial, como no caso da internet ou por revistas, o consumidor pode usufruir do chamado direito de arrependimento. Nesse caso, a troca pode ser efetivada em até sete dias, contados a partir do recebimento do produto. A pessoa pode, nesse período, desistir da aquisição e pedir o dinheiro de volta, sem arcar com frete ou outros custos.
O Reclame Aqui considera que o alto número de problemas que tem sido registrado nesta época está associado ao fato de muitos consumidores terem aproveitado a Black Friday, no dia 24 de novembro, para comprar presentes. Até agora, os setores que receberam maior número de reclamações por este portal foram: lojas virtuais, noda e calçados, transportes, eletroeletrônicos e eletrodomésticos.
Apesar do crescimento do volume de compras pela internet, o Brasil ainda não tem uma regra sobre comércio eletrônico. No país, esse tipo de transação é regulamentada pelo Decreto 7.962, de 2013. O advogado Paulo Roque Khouri avalia, contudo, que a regra, que trata sobretudo da disponibilização de informações nos sites, é insuficiente.
Consumidores que precisem trocar produtos adquiridos em sites hospedados no exterior, por exemplo, podem ter dificuldades. “Teoricamente, esses sites estão submetidos às regras do Brasil. Mas, se os consumidores tiverem problemas, esse fornecedor teria que ser demandado no exterior”, detalha o especialista. Na opinião dele, “é um vazio que existe muito grande em nosso direito e deixa muito exposto o consumidor”. Para evitar problemas, ele sugere que as pessoas façam compras em sites com credibilidade, pois, assim como no mundo físico, “na internet, há bons e maus fornecedores”.